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A última etapa da educação básica é o principal gargalo da educação brasileira devido a vários fatores, mas há caminhos para mudanças

Um estudante que concluiu o Ensino Médio em 2017 sabe tanto de Língua Portuguesa quanto quem concluiu a etapa em 2007. Se a disciplina for Matemática, os formados de hoje sabem ainda menos se comparados aos da década anterior. Isso não seria um problema tão grave se os índices de aprendizagem não fossem tão baixos. Para mudar isso, é preciso entender os fatores que levam a este cenário.

Esse é o cenário trazido pelos dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 2017, divulgados recentemente pelo Ministério da Educação e monitorados pelo Todos pela Educação. Em dez anos, o percentual de estudantes do Ensino Médio com o aprendizado adequado em Língua Portuguesa passou de 24,5% para 29,1%. Em Matemática caiu de 9,8% para 9,1%.

Realizado a cada dois anos, o Saeb é composto por provas de escala nacional que avaliam o desempenho nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática de alunos do 5º e 9º ano do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio. Além de servir de base para calcular o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), os dados oferecem evidências para a formulação de políticas públicas que melhorem o ensino.

Na prática, isso significa que a maioria dos estudantes brasileiros não consegue localizar informações explícitas em artigos de opinião ou em resumos. Em Matemática, a maioria não é capaz de resolver problemas e operações fundamentais com números naturais, tampouco reconhece o gráfico de função a partir de valores fornecidos em um texto.

No total, 14 Estados tiveram queda na proficiência média de Português e 16, em Matemática. Tomando a rede estadual de São Paulo como exemplo, quem termina o Ensino Médio sai com o desempenho de Língua Portuguesa esperado para um estudante três anos mais novo. Já em Matemática, a defasagem começa mais cedo. No 9º ano, os alunos têm média correspondente ao que seria do 6º ano, como apontou análise da Folha de S. Paulo.

Contudo, olhando para a média geral de aprendizagem dos anos iniciais do Ensino Fundamental houve aumento de 27,9% para 60,7%, no nível de proficiência em Língua Portuguesa, e de 23,7% para 48,9%, em Matemática. Nos anos finais da etapa, também houve ligeiro avanço chegando a 39,5% (de 20,5%) e 21,5% (de 14,3%), em Português e Matemática, respectivamente.

Onde começa o problema?

O Ensino Médio é o principal gargalo da educação brasileira, uma vez que poucas políticas públicas têm surtido efeito. As barreiras que pioram a qualidade da última fase da educação básica são muitas e de causas variadas.

Um dos pontos é o alto índice de evasão: cerca de 3 milhões de jovens abandonam os estudos nessa etapa todos os anos.

Outro fator, apontado por Caio Sato, coordenador do núcleo de inteligência do Todos pela Educação, é o fato de o aprendizado ser um processo acumulativo. Se o aluno não aprende o adequado nas etapas iniciais, a dificuldade vai aumentando com o passar dos anos.

“A defasagem começa cedo na vida dos estudantes até desembocar no Ensino Médio, e são muitos os fatores que contribuem para isso. A própria passagem dos anos iniciais para os finais representa, por si só, uma grande mudança para o estudante, que passa a ter mais professores. Alguns precisam mudar de escola, existe maior dependência de transporte escolar, entre outros fatores”, enumera o coordenador.

Mas se o baixo desempenho compromete a evolução da aprendizagem do estudante, o sucesso nas etapas iniciais do Ensino Fundamental também é passado adiante, certo? Não é bem assim.

O diretor do Instituto Ayrton Senna, Mozart Neves Ramos, afirmou ao G1 que dificilmente há uma aprendizagem associada. “Nos anos iniciais os alunos têm no máximo dois professores por turma, quando ingressam nos finais começa a ter o vínculo diversificado com professores divididos por disciplina. O processo se torna mais complexo, há uma exigência maior da formação do professor”.

A falta de professores com formação adequada, aliás, é outro grave problema. Quase 40% dos 513,4 mil docentes do Ensino Médio dão aulas de disciplinas para as quais não têm formação específica, como apontou o Censo Escolar 2018.

É preciso conquistar os jovens

O desencanto com a escola é narrativa recorrente de estudantes dos anos finais e é causado por uma organização curricular com compartimentação de conteúdos e abordagem pedagógica distante da realidade do jovem.

“Vale lembrar que é justamente nessa etapa que a educação passa a concorrer com outros aspectos da vida do estudante, como a necessidade de complementar a renda da família ou focar no trabalho como aprendizado prático”, afirma o pesquisador Caio Sato.

Outra crítica ao modelo atual do Ensino Médio é a visão de que a etapa é preparatória para o Ensino Superior, em vez de ser considerada os passos finais da Educação Básica. É o que enfatiza Cristina Dias Allessandrini, doutora em psicologia escolar e do desenvolvimento humano pela Universidade de São Paulo (USP):

“Essa moçada não foi convidada a participar da sociedade. Ela só cumpre tarefas e decora conteúdo para passar no vestibular. Isso deve mudar com o foco na aprendizagem por competências, que visa formar um ser humano para a vida”, reflete.

O que vem por aí

Homologada em dezembro de 2018, a Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio (BNCC) é, assim como nas outras etapas da educação básica, orientada por competências, que podem ser entendidas por um conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores importantes para a construção de sociedades mais humanas, socialmente justas e sustentáveis.

A BNCC faz parte do Novo Ensino Médio, estabelecido pelo Ministério da Educação em 2017 ao alterar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para oferecer uma nova estrutura, que amplia o tempo mínimo do estudante na escola – de 800 horas para 1.000 horas anuais – e prevê uma organização curricular mais flexível, com possibilidades de escolha aos estudantes e itinerários formativos com foco nas áreas do conhecimento e na formação técnica e profissional.

Segundo Caio Sato, as mudanças no Ensino Médio apontam no sentido correto de estabelecer um padrão mínimo de aprendizagem e, principalmente, o protagonismo juvenil. “Mas o sucesso desta política vai depender muito da forma como ela será implementada”, alerta.

Ponto para a educação integral

O Saeb mostra também que os cinco Estados que mais avançaram em Português no Ensino Médio foram Espírito Santo, Pernambuco, Alagoas, Acre e Goiás. Em Matemática, destacam-se Pernambuco, Alagoas, Espírito Santo, Sergipe e Ceará.

Segundo análise do Todos pela Educação, há indícios de que algumas políticas públicas podem ter ligação com o bom resultado de alguns estados, como a ampliação da educação em tempo integral, que pode estar contribuindo para ressignificar a importância de estar na escola.

Modelo disso são os ginásios pernambucanos, no qual o aluno fica o dia inteiro na escola e tem uma carga de disciplinas eletivas. Com isso, os jovens podem estudar assuntos pelos quais mais se interessam.

Utilizar práticas pedagógicas que sejam colaborativas, como o aprendizado por Projeto de Vida, a oferta de temas que possam dar um norte para o futuro, como o ensino de empreendedorismo e o uso de recursos tecnológicos são outros caminhos que podem ajudar a dar mais sentido ao Ensino Médio.

Por que a aprendizagem no Ensino Médio está estagnada?
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