Beatriz Torres, educadora brasileira que mora na Finlândia, fala sobre as características inovadoras que fazem do país líder em rankings educacionais.

Beatriz Fortes, educadora brasileira que mora na Finlândia, fala sobre as características inovadoras que fazem do país líder em rankings educacionais.
É de bicicleta, com o caule da flor em mãos e os pés em contato com a grama que crianças estão em aula, em uma floresta próxima à escola. De maneira prática e sensorial, os alunos têm uma aula interdisciplinar de biologia: aprendem sobre animais observando a formiga no dedo, geografia nos relevos visíveis da paisagem, a língua ao se comunicarem para contar suas experiências. Na Finlândia, a teoria não se separa da prática, e o aprendizado também é inseparável da afeição.
Há provavelmente poucos sistemas educacionais que instiguem tanta curiosidade e reflexão quanto o finlandês. Com uma premissa integral, contrária à hierarquização e ao encaixotamento de disciplinas, a Finlândia obtém contínuos resultados expressivos em avaliações como o PISA (Programme for International Student Assessment), figurando ao lado de países com sistemas educacionais mais rígidos e tradicionais. O sistema educacional nórdico prevê uma educação que acompanha o cidadão desde a mais tenra idade até a formação superior: 99% da população possuí educação fundamental e 62% educação superior.
No centro da pedagogia contínua e da inovação educativa, figuram alunos autônomos em seu aprendizado e educadores preparados para servirem como mentores de percurso. Quando a educadora brasileira Beatriz de Oliveira Fortes se mudou para Karjaa, cidade a 280 quilômetros da capital Helsinque, surpreendeu-se com a escola afetiva e integrada à comunidade. Ela relata sua experiência no blog Beatriz na Finlândia. “Professores e alunos aqui tem liberdade para aprender e consciência de como usar essa liberdade.”
A figura do profissional de educação é muito valorizada. Um educador do ensino médio ganha normalmente algo em torno de 3,5 mil euros (em torno de 9 mil reais). Para que ele exerça a profissão, deve possuir mestrado e passar por testes onde sua vocação e suas habilidades serão postas à prova. Ainda que receba aporte da gestão escolar, o educador é um livre interventor de realidade de seus alunos.
“As crianças e adolescentes têm uma relação muito positiva com a escola. Não é somente um lugar de aprendizado, mas também de convivência e afetividade”, explica Beatriz. Como estão inseridos em um sistema educacional desde muito jovens, os alunos sentem que a escola lhes pertence, em uma tríade aluno/escola/comunidade. Essa valorização tem origem, segundo a educadora, em um contexto de pós-guerra: foram os próprios moradores que reconstruíram escolas destruídas em batalhas, entendendo seu papel vital no reviver da comunidade.
O sistema finlandês prima pela metodologia de aprendizado por projetos – os alunos aprendem diversas competências de maneira interdisciplinar, baseadas na relação com o entorno. “Também são igualmente importantes matérias como música, mecânica, culinária e artes”, complementa Beatriz. A maioria das escolas funciona das 9h até às 15h e quando as crianças saem dela, não há lição de casa. A pausa e a diversão são parte do aprendizado.
Por renovar constantemente sua metodologia, não é de se estranhar o papel que a tecnologia cumpre no currículo escolar finlandês: os alunos contam com tablets e notebooks, e são incentivados a usá-los para potencializar seu aprendizado. Em paralelo, Beatriz atenta para a preocupação que as escolas têm no sentido de que a tecnologia seja uma ferramenta disruptiva a ser trabalhada em conjunto com outras formas de aprendizado, como o contato com a natureza e trabalhos manuais.
Neste segundo semestre, entra em vigor uma reforma curricular na Finlândia, baseada em premissas como uma educação voltada para o futuro – portanto mais inserida em um contexto tecnológico – com formas cooperativas de aprendizado, igualdade de gênero e empreendedorismo. Ainda que tenha um currículo complexo e integral, com resultados positivos em termos de avaliação quanto de qualidade, o país entende que um currículo que prepara cidadãos para um mundo em transformação é também um currículo em constante renovação.
*Crédito da foto: Amanda Soila / Ministério de Relações Exteriores da Finlândia