Conheça mais sobre os projetos de transformação social dos educadores brasileiros que concorrem ao maior prêmio internacional de Educação
O Global Teacher Prize é considerado o maior prêmio internacional na área de Educação e tem como objetivo reconhecer o trabalho de educadores que transformam realidades. Na edição de 2020, três brasileiros estão entre os 50 finalistas que concorrem ao prêmio de um milhão de dólares.
Organizada pela Varkey Foundation, a premiação acontece anualmente e, nesta edição, conta com a parceria da Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e Cultura (UNESCO). A ideia é homenagear iniciativas que impactam positivamente os estudantes e as comunidades da qual fazem parte. O valor do prêmio é usado para dar continuidade aos projetos inscritos.
Para Débora Garofalo, educadora que ficou entre os 10 melhores professores do mundo no ano anterior, a premiação é importante para valorizar o trabalho de todos os educadores, do Brasil e do mundo. Em artigo escrito para o UOL, ela comenta sobre as indicações dos colegas brasileiros. “O trabalho destes professores tem em comum a inclusão de estudantes, principalmente de periferias e baixa renda, com atividades significativas e transformadoras”, conclui.
DESTAQUES BRASILEIROS
A educadora Débora Garofalo foi a primeira mulher brasileira e sul-americana a se classificar para o TOP10 do Global Teacher Prize 2019. O projeto inscrito por ela alia robótica e sucata, trabalhando a coleta de lixo na comunidade e a transformação tecnológica dos materiais pelos estudantes. Apesar do prêmio da edição de 2019 ter sido conquistado pelo professor queniano Peter Tabichi, a educadora ganhou destaque internacionalmente e hoje assume um cargo de gestão na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.
Conheça mais sobre o trabalho de Doani Bertan, Lília Melo e Francisco Freitas, os três finalistas brasileiros do Global Teacher Prize 2020, que terá o resultado anunciado em junho deste ano.
Doani Emanuela Bertan
Professora de educação especial e Língua Portuguesa;
Escola Municipal de Ensino Fundamental Júlio de Mesquita Filho – Campinas (SP)
O desafio de levar educação de qualidade e aprendizagem adequada aos estudantes, levou Doani Bertan a criar um canal no YouTube, o Sala8, para ensinar Libras (Língua Brasileira de Sinais) de uma forma divertida e lúdica. “Desde sempre, a problemática enfrentada na educação bilíngue é a escassez de material didático específico. Os materiais impressos dificultam o entendimento do sinal e há de se considerar o regionalismo linguístico, que geralmente não é contemplado”, reforça a educadora.
Antes de criar o canal, Doani costumava gravar videoaulas e tirar dúvidas sobre as tarefas de casa por meio de videochamadas. Mas, por uma limitação de tempo e acessibilidade, percebeu que poderia sistematizar o conteúdo para ser trabalhado com mais profundidade. Debateu essa possibilidade com os estudantes do Fundamental I, e a aceitação foi surpreendente.
“Conseguir explorar o potencial tecnológico requer um grande repensar pedagógico para proporcionar ao aluno o papel de agente de sua aprendizagem”, afirma Doani. Depois de um planejamento intenso, muita pesquisa e estudos técnicos para fazer a edição, legendagem e adaptação do conteúdo em vídeos curtos, ela finalmente lançou o canal.
A partir dos apontamentos da turma, sobretudo dos estudantes com deficiência auditiva, a educadora foi aprimorando as técnicas e não demorou até que os resultados começassem a aparecer. Os estudantes pediam para rever alguns vídeos, participavam na sugestão de temas e iam, aos poucos, se aproximando de uma educação igualitária entre os pares.
“As videoaulas são planejadas e desenvolvidas para atingir a todos, não apenas aos estudantes com deficiência. Com a imersão dos alunos ouvintes na comunidade surda, a Libras passou a ser entendida como uma ponte para a comunicação, novas amizades, aprendizados e empatia”, conta Doani.
A educadora diz que a sensação de ter sido indicada ao Global Teacher Prize 2020 foi indescritível e será uma oportunidade de dar visibilidade à educação bilíngue, no Brasil e no mundo. “A escola tem urgência na sua reformulação, na adequação às exigências do tempo presente e na oferta de ferramentas para que todos os públicos sejam contemplados, cada um em sua especificidade”, conclui.
Lília Melo
Professora de Língua Portuguesa e projetos
Escola Brigadeiro Fontenelle -Terra Firme, Belém (PA)
Em 2014, impactada pela violência recorrente no bairro em que dava aulas, localizado na região metropolitana Terra Firme, a professora Lília Melo começou a notar que a evasão escolar aumentou a partir de um grave incidente na região. Em uma tentativa de trazê-los de volta, estimulando a autonomia dos estudantes, ela lançou o projeto “Juventude negra periférica: do extermínio ao protagonismo”.
A ideia era aprimorar e produzir arte na escola e para a comunidade, dentro e fora da sala de aula. A partir de oficinas de teatro, saraus, poesia, dança, capoeira, música e cinema, os estudantes de Ensino Médio passaram a ocupar a escola e as ruas com suas próprias vozes, criando vínculos e narrando suas vivências. Esse projeto rendeu à Lila o Prêmio Professores do Brasil, realizado pelo Ministério da Educação (MEC), em 2018.
Para trabalhar ainda mais a questão da representatividade, a educadora mobilizou uma campanha, com a ajuda da imprensa local, para levar seus estudantes ao cinema. Nem todos tinham condições de comprar os ingressos para assistir ao filme “Pantera Negra”, da franquia Marvel, que conta a história de um herói negro e uma comunidade única capaz de salvar o mundo com a sua cultura e tecnologia.
Na época, empresas se uniram para tornar essa oportunidade possível, custeando a viagem e os ingressos de cerca de 400 estudantes. As reflexões posteriores foram essenciais para motivar e estimular as produções audiovisuais do Cine Clube TF, feitas pelos próprios estudantes e exibidas na rua, para que toda a comunidade pudesse participar.
“A lição desse projeto é que é possível transformar vidas e fazer educação pública de qualidade através de uma percepção coletiva. Agora, nós temos condições de transformar a nossa realidade e deixar um mundo melhor para os que vem”, disse Lília em vídeo gravado para a TV Escola.
Francisco Celso Freitas
Professor de História e especialista em educação inclusiva
Centro de Ensino da Unidade de Hospitalização de Santa Maria (DF).
Além de ser professor de História, Francisco Celso Freitas também é produtor cultural e acredita que a arte é um importante instrumento pedagógico para disseminar os direitos humanos. E foi através da cultura, da música e da educação que transformou a vida de cerca de 150 jovens dentro da Unidade de Santa Maria, no Distrito Federal, onde leciona desde 2015.
A instituição abriga meninos e meninas que tem problemas com a lei e estão privados de liberdade. “Existe um desconhecimento da sociedade sobre o que é o sistema socioeducativo. As pessoas não sabem que existe um núcleo de ensino e que os jovens têm direito à escolarização”, disse o professor em entrevista ao Porvir.
A fim de mudar esse estigma e engajar os jovens em uma narrativa que conversasse mais com a realidade deles, o educador começou a usar a música e cultura do hip-hop para debater direitos humanos e cultura de paz. A partir de saraus, rodas de conversa, festivais de música, cine-debates e outras atividades culturais, os estudantes passaram a fazer parte do projeto RAP (Ressocialização, Autonomia e Protagonismo).
Não demorou até que os jovens se transformassem em artistas e começassem a lançar suas próprias produções: videoclipes, músicas, e-books. Todos compartilhados publicamente e gratuitamente, para que outras pessoas pudessem conhecer e se inspirar a partir desses trabalhos. Em 2019, um desses produtos audiovisual, o videoclipe “18 razões para a não redução da maioridade penal”, entrou para a exposição no 52º Festival de Cinema Brasileiro.
Em entrevista para o portal do G1, o educador comenta sobre os resultados: “A gente consegue deixar eles mais soltos, melhorar a expressão oral, corporal, escrita e, o principal, a autoestima. Nem quando eles estavam em liberdade conseguiam perceber todo esse potencial”, afirmou.