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Especialistas apontam como a neurociência pode contribuir com a educação e explicam alguns mitos, como a afirmação que só usamos 10% do nosso cérebro.

Explicar os processos de aprendizagem, mostrar a importância de lidar com as emoções e como assimilar conhecimento;e até mesmo contribuir para mudarmos a forma como a escola e as abordagens pedagógicas são estruturadas hoje. Essas são algumas das contribuições que a neurociência-estudo sobre o sistema nervoso e suas funcionalidades – pode trazer para o campo da educação.

Essas discussões foram colocadas na mesa Neurociência e Aprendizagem, durante a quarta edição do Fórum de Inovação Educativa, promovido pelo jornal Folha de S. Paulo em parceria com a Fundação Telefônica Vivo, em novembro.

Para Guilherme Brockington, doutor em educação e professor da Universidade Federal do ABC, a maior contribuição da neurociência está em repensar a estrutura da escola. “O desenvolvimento cognitivo se dá com a interação entre pessoas, e o papel do professor é fundamental para isso”, afirma.
Fernando Louzada, doutor em psicologia e professor da Universidade Federal do Paraná,recomenda cuidado com a aplicação da neurociência para não se criar a expectativa de que ela é prescritiva, ou seja, que vai dar receitas de como o professor deve agir. Para ele, conceitos básicos, principalmente sobre amadurecimento do cérebro, deveriam ser incorporados na formação de professores.

Ramon Cosenza, coordenador do programa de pós-graduação em neuropsicologia na Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais,aponta na mesma direção: “A neurociência traz uma série de informações úteis. É preciso ter um diálogo entre professores, escolas e quem trabalha no campo científico para se extrair o melhor do conhecimento”.

Imagem mostra palestrantes da mesa Neurociência e Aprendizagem durante Fórum de Inovação Educativa.

Convidados da mesa Neurociência e Aprendizagem durante o Fórum de Inovação Educativa (esq.p/dir. Fábio Takahashi (Mediador)Guilherme Brockington,Ramon Cosenza e Fernando Louzada)

Os especialistas também aproveitaram o debate para explicar alguns ‘neuromitos’, ou seja, mitos ligados ao funcionamento do cérebro. Confira quais são eles:

1 – Mito: Só usamos 10% do nosso cérebro
“É um dos grandes mitos! Isso teve origem, se não me engano, em um experimento da década de 1960 em que um rato continuava vivo e funcional até ficar com 10% do cérebro. Nós usamos o cérebro o tempo todo em toda a sua potência,mesmo quando fazemos nada.Ele está o tempo todo ligado. Então não existe a hipótese de reprogramar o cérebro para usar mais de 10% dele”, conta o doutor Guilherme Brockington.

2 – Mito: Aprendemos somente até determinada idade
Existe uma enorme plasticidade nos primeiro meses e anos de vida, sem dúvida nenhuma. São janelas importantíssimas de oportunidade, mas não podemos dizer que tudo está perdido depois disso. Costumo usar a metáfora de que as conexões das redes neuronais são como trilhas. Nessa janela, você vai precisar de uma enxada para abri-las. Lá na frente, você vai precisar de um trator. Por isso que se fala desses períodos de maior plasticidade: de zero a três anos, até seis anos e na puberdade. Mas não dá para falar que essa janela se fecha”, afirma o professor doutor Fernando Louzada.

3 – Mito: A tecnologia prejudica o cérebro
Ramon Cosenza explica que isso não pode ser considerado totalmente verdade. Segundo ele, é possível resolver o descompasso entre nosso cérebro paleolítico e a velocidade da sociedade moderna, desenvolvendo funções executivas, formadas por três núcleos: as habilidades cognitivas – como assimilamos informações; as habilidades intrapessoais – como regulamos nossos comportamentos; e as habilidades interpessoais – como lidamos com as nossas e as emoções das outras pessoas.

“As crianças interagem cada vez mais com máquinas, com grupos virtuais. Então é preciso um esforço para desenvolver essas funçõesexecutivas para que os jovens se tornem adultos autônomos e resistam a essas mudanças que estão ocorrendo na nossa sociedade.Não é simples fazer isso, não tem uma fórmula. Uma coisa se sabe: todas essas habilidades são aprendidas na interação. Uma parte disso está sendo feito pelo que se chama educação socioemocional, mas não tem uma fórmula perfeita”, resume o especialista.

4 – Mito: Adolescentes são difíceis por causa dos hormônios
O professor Fernando Louzada lembra que na puberdade há uma oportunidade fantástica de modificar alguém. “Um adolescente de 15 anos, diante de uma situação extrema, não toma decisões igual a um adulto. A escola consegue agir se for inclusiva, e se preocupar com as funções executivas,auxiliando o aluno a regular os seus comportamentos”.

Guilherme Brockington defende que os comportamentos dos adolescentes são necessários, não é porque ele é “apenas chato”. A adolescência é a construção do que seremos, a maturação cerebral vai até os 24 anos. ’A formação é tão ruim que os professores acham que tem a ver com hormônio. E não é só hormônio, é uma reestruturação funcional do cérebro que implica em deficiência na tomada de decisão, falta da compreensão de risco e comportamentos impulsivos”.

5 – Mito: Xadrez e música clássica deixa a pessoa mais inteligente.
Ramon Cosenza relembra uma célebre frase de Millôr Fernandes: ‘jogar xadrez é muito importante porque desenvolve muito a capacidade de jogar xadrez!’.Segundo o especialista, “o cérebro trabalha muitas vezes na forma de estanque. É preciso focar no que queremos aprender, porque o conhecimento não espalha para outras áreas do cérebro sozinho”.

Isso não quer dizer que atividades físicas, artísticas e de raciocínio não sejam importantes. Pelo contrário, precisam estar no centro, mas de forma intencional.

“A neurociência pode mostrar, por exemplo, que a educação física na escola precisa ser mais do que colocar os meninos para jogar bola. Arte e música impactam na cognição. Mas existe um ‘neuromito’ de que a música clássica deixa mais inteligente. Existe uma relação entre música, emoção e estado de humor. Mas se acha que só ela pode tornar alguém inteligente, perca a esperança”, explica Guilherme Brockington.

6 – Mito: É preciso simplificar o conhecimento para crianças.
O professor Guilherme Brockington defende também que é preciso rever o papel da brincadeira, porque ela é fundamental para o desenvolvimento cognitivo. Portanto, não deveria acontecer apenas para preencher a grade curricular. “A contação de histórias, por exemplo, aumenta a ocitocina e diminui o cortisol (hormônio ligado ao estresse). Não é apenas algo lúdico. A criança pode aprender com histórias mais complexas e palavras difíceis têm de ser usadas. Deveríamos ler mais livros de autores como Guimarães Rosa”, presume.

6 mitos sobre o funcionamento do cérebro que a neurociência explica
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