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A pandemia aproximou a educação da tecnologia, mas há um longo caminho até o desenvolvimento de competências digitais docentes

#Educação#Educadores#TecnologiasDigitais

A imagem mostra uma professora que veste camisa cor de rosa, com crachá e óculos com aro azul. Ela está sentada em frente ao computador e aponta para a tela. Ao seu lado está uma criança de blusa de lã azul e braços cruzados. Ao lado dela, mais embaçado, está o rosto de outra criança.

Após dois anos de aulas virtuais, será que as competências digitais docentes evoluíram em 2022? Desde a pandemia, a tecnologia tem sido fundamental para os processos de comunicação e aprendizagem na escola, mesmo que os recursos disponíveis ainda sejam limitados. Isso fez com que mais professores reconhecessem a importância da tecnologia para a educação, mas não se traduziu em maior qualificação para usá-la em práticas pedagógicas que promovam o aprendizado.

A avaliação é parte do Relatório Guia Edutec 2022, lançado recentemente pelo Centro de Inovação para Educação Brasileira (CIEB). O documento mediu a evolução da adoção tecnológica das escolas públicas brasileiras a partir de quatro dimensões: visão, competências digitais, recursos utilizados e infraestrutura. O questionário foi respondido por mais de 104 mil escolas de 27 redes de ensino estaduais e 5.230 redes municipais, alcançando 75% das escolas públicas.

“Os indicadores mostram que cresceu muito a visão, ou seja, a crença que os educadores têm no potencial da tecnologia. Porém, a infraestrutura é uma dimensão que continua muito baixa, representando um gargalo para o desenvolvimento dos professores”, avalia a diretora presidente do CIEB, Lucia Dellagnelo.

Nesta terceira reportagem da série de retrospectiva de temas que marcaram a educação brasileira em 2022, você vai entender os motivos que limitam o desenvolvimento de competências digitais de professores. Já falamos também sobre os maiores desafios enfrentados pelas escolas públicas e o atual estado do ensino híbrido no Brasil. Não deixe de acompanhar!

Competências digitais docentes

A jornada para desenvolver competências digitais docentes envolve três dimensões, segundo Lilian Bacich, coordenadora do curso de pós-graduação em Metodologias Ativas no Instituto Singularidades e diretora da Tríade Educacional. Em primeiro lugar, a formação profissional aproxima os professores do uso de Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Associado a isso, vem a prática pedagógica e a reflexão sobre como incorporar diferentes recursos às experiências de ensino e aprendizagem. Por fim, tem uma dimensão pessoal, que aborda o uso responsável e ético das tecnologias.

No entanto, os professores ainda estão nos estágios iniciais dessa jornada. Embora tenham conseguido se apropriar de tecnologias para dar rápida resposta às necessidades da pandemia, isso não se traduziu em avanços, como explicou Lucia Dellagnelo: “Depois da pandemia, ficou clara a importância da tecnologia não só no dia a dia das escolas, mas também para oferecer outras experiências de aprendizagem e para personalizar o atendimento aos estudantes. A gente vê uma quebra de resistência entre os professores, mas isso não está necessariamente relacionado ao desenvolvimento de competências”.

O primeiro entrave encontrado nesse sentido está relacionado à infraestrutura, ou seja, faltam disponibilidade e qualidade de hardware e conectividade dentro das instituições. Adicionalmente, as formações de professores também não estão dando conta de apoiar o desenvolvimento de competências digitais docentes.

“Em 2022, os professores ficaram mais conscientes das limitações que eles têm. Eles não aprenderam a usar tecnologia nem em sua formação inicial, nem nas formações continuadas oferecidas pelas secretarias de educação”, observa a diretora presidente do CIEB.

Da formação à experimentação

Um dos dados que se destacaram no Relatório Guia Edutec 2022 mostrou que, entre 45% das escolas públicas que responderam ao questionário, as formações continuadas para uso de tecnologia oferecidas pelas secretarias de educação geraram pouco impacto nas práticas pedagógicas docentes. Além disso, 43% delas afirmaram que as competências dos professores estão em nível inicial.

O achado é semelhante ao da autoavaliação que o CIEB disponibiliza gratuitamente em seu site. A maioria dos 117 mil docentes que já preencheram a autoavaliação se posiciona entre os níveis 1 ou 2, numa escala de um a cinco. “Eles são capazes de encontrar materiais na internet para aulas expositivas e avaliações, mas ainda não é um uso com metodologias ativas e frequente em sala de aula”, disse Larissa Santa Rosa, especialista em educação do CIEB, durante evento com os resultados do relatório.

Nesse sentido, entende-se que há o desafio de implementar formações que sejam efetivas para transformar a prática docente, apesar dos esforços das secretarias e dos professores. Por isso, as formações continuadas precisam envolver experimentação e metodologias ativas direcionadas ao uso intencional das tecnologias e alinhado à proposta pedagógica da escola e ao currículo da rede de ensino.

“Não adianta dar cursos se os professores não tiverem espaços para experimentar e planejar aulas usando tecnologia”, afirma Lucia. “Para nós está claro que a melhor estratégia para o professor se desenvolver é ele aprender e compartilhar práticas e desafios com outros professores. Muitas redes já estão formando essa comunidade de trocas entre pares como uma estratégia efetiva para o desenvolvimento de competências dos professores.”

Recife é exemplo para outras redes

A capital pernambucana tem uma das redes de ensino que se destacam no desenvolvimento de competências digitais docentes. Durante a pandemia, a gestão municipal ofereceu tablets e conectividade para todos os estudantes, além de notebooks para professores. “Nós aprendemos que não bastava dar equipamentos e conectividade. Por isso, criamos um programa de desenvolvimento de competências digitais para nossos professores com uma série de formações presenciais e remotas. É um início de trabalho, mas que vai gerar grande transformação”, disse o secretário de Educação de Pernambuco, Frederico Amancio.

O case de Recife foi contado por Amancio durante a 5ª edição do EnlightED, uma das principais conferências globais de educação e inovação, organizada pela Fundação Telefônica, IE University, Fundação “la Caixa” e South Summit. O painel que o secretário participou ocorreu em 16 de novembro e pode ser assistido na íntegra. Durante sua exposição, ele contou que a inovação partiu do diagnóstico do estágio de maturidade tecnológica dos professores da rede, identificado através da ferramenta de autoavaliação gratuita do CIEB. A partir daí, foram desenvolvidas cinco trilhas formativas, abarcando desde o nível mais básico de conhecimento tecnológico ao mais avançado.

Além de diferentes trilhas formativas, a rede de Recife também conta com unidades descentralizadas de apoio ao dia a dia escolar, chamadas de UTECs [Unidades de Tecnologia na Educação para a Cidadania]. “Estruturamos um time específico, com professores da nossa rede, mas que têm uma formação especial para apoiar o uso de recursos digitais e a formação de outros docentes no dia a dia das escolas”, disse o secretário.

Um passo à frente

O balanço de 2022 em relação aos avanços de competências digitais docentes deixa três lições importantes para o próximo ano. Em primeiro lugar, é preciso investir em capacitação de professores, desde que sejam formações que possibilitem experimentação e aprendizado entre pares.

Adicionalmente, a infraestrutura é uma condição para promover o uso qualificado de tecnologias na educação. Recife é exemplo de como diagnóstico e planejamento podem superar entraves nesse sentido. “Para dar conta do gargalo da infraestrutura, é preciso planejar e direcionar adequadamente as políticas e os investimentos públicos no novo ciclo de gestão governamental em 2023”, recomenda o relatório do CIEB.

É também fundamental que os educadores sejam sujeitos desse processo, como recomenda o professor da rede municipal e estadual do Rio de Janeiro, Doug Alvoroçado. Ele dividiu a mesa com Frederico Amancio no EnlightED para contar como a tecnologia o auxilia a trabalhar a educação inclusiva em seu dia a dia. Pela sua experiência, ele acredita que mesmo com lacunas e carências que toda escola pública tem, é possível começar a inovar com o que se tem no alcance.

“Nós precisamos buscar dar os primeiros passos nessa direção. Começa com a inclusão de um dispositivo tecnológico para apoiar uma prática que você já faz em sala de aula e com o mapeamento de recursos já disponíveis”, indica o educador. Ele também destaca a importância das  redes de apoio. “Quando você dá esse primeiro passo, você percebe que tem muita gente querendo ajudar, que estende a mão, que compartilha um recurso ou uma prática, seja ela da sua escola, da sua rede ou até mesmo de outros lugares. Tem também muito colega disponibilizando conteúdos de qualidade nas redes sociais”, indicou.

As competências digitais docentes estão evoluindo?
As competências digitais docentes estão evoluindo?