Especialista explica por que os jogos típicos da cultura popular podem incrementar o aprendizado de crianças
Bolinha de gude, amarelinha, peão, queimada, pega-pega, baliza, corre cotia. Há muitas gerações, essas brincadeiras fazem parte da infância dos brasileiros. Assim como lendas, cantigas, provérbios, crenças e danças populares, elas ajudam a compor o folclore brasileiro, que tem seu dia celebrado em 22 de agosto.
A palavra é derivada dos termos em inglês folk e lore, que juntos significam o saber de um povo. É sabedoria construída coletivamente, de forma anônima e transmitida oralmente, além de ressignificada, através das gerações. Conhecer o folclore é uma maneira de aproximar as crianças de seus antepassados, além de estimular o interesse pela riqueza cultural e popular do nosso país, com todas as suas particularidades regionais.
É o que defende a publicitária e produtora cultural Patrícia Gomes, que há anos pesquisa as tradições da cultura popular brasileira. Natural de Uruana, Goiás, ela é autora da coleção de livros infantis Brincar é Folclore. O primeiro volume traz 24 brincadeiras e jogos folclóricos, o segundo é dedicado à parlendas, trava-línguas e jogos de adivinhação. Já o terceiro será lançado no próximo ano e resgata as tradições das brincadeiras de roda.
Produzido de forma independente e lançado via edital, Patrícia faz parceria com empresas e governo para distribuir os livros gratuitamente às crianças que vivem em situação de vulnerabilidade social. Além disso, a rede municipal de educação de Pirenópolis (GO), adotou o material como parte da capacitação de professores.
Em entrevista à Fundação Telefônica Vivo, a autora falou sobre como as brincadeiras folclóricas podem ser aliadas da educação infantil. Confira a seguir:
No prefácio do seu livro, o folclorista Bariani Ortêncio escreveu que “toda criança deve praticar o folclore”. Por quê?
Patrícia: O folclore é a ciência de um povo, o conhecimento popular que vai passando de geração para geração através de lendas, crenças, superstições, provérbios, adivinhações, canções, comidas, danças, poesias, brincadeiras e jogos. É uma tradição oral que faz parte da história de quem nós somos. Manter viva essa cultura é estar sempre em contato com a nossa essência, com aquilo que aprendemos com os nossos familiares. É uma sabedoria que não está na escola, mas pode fazer parte dela também.
O que as crianças podem aprender com as brincadeiras e os jogos folclóricos?
Patrícia: As brincadeiras folclóricas são coletivas, por isso ajudam a fortalecer as relações humanas e o convívio com o outro. De forma lúdica, a criança aprende a compartilhar, dividir, trabalhar em grupo, colocar-se no lugar do outro, a ganhar e a perder. É todo um compartilhar de experiências que fica para a vida. Os jogos folclóricos ainda têm a particularidade de aproximar as famílias, porque o pai, o avô e avó conhecem as brincadeiras, ensinam outras às crianças e por aí vai. Sem contar o estímulo à criatividade.
“As brincadeiras folclóricas são coletivas, por isso ajudam a fortalecer as relações humanas e o convívio com o outro. De forma lúdica, a criança aprende a compartilhar, dividir, trabalhar em grupo, colocar-se no lugar do outro, a ganhar e a perder. É todo um compartilhar de experiências que fica para a vida”.
Como a criatividade é estimulada?
Patrícia: A criança é parte ativa da construção de muitas dessas brincadeiras, o que deixa tudo mais divertido. E elas não precisam de nada, só de amigos para brincar junto. Quando faço oficinas em parques e praças, eu mostro que elas podem construir seus próprios brinquedos com coisas que estão ao redor, como folhas, gravetos. Uma bola de meia serve muito bem para várias atividades. Peteca a gente faz com pena de galinha, palha de milho e uma caixinha de fósforo. Para marcar no chão uma amarelinha não precisa de giz. Pode ser um caco de telha ou um pedaço de carvão.
Na capacitação de professores, você defende que as brincadeiras folclóricas são multidisciplinares. Como elas podem ser usadas em diferentes aulas?
Patrícia: Para além da diversão, elas podem ser trabalhadas na escola de muitas maneiras. As brincadeiras guiadas por um professor de educação física, por exemplo, trabalham a psicomotricidade das crianças. Nos meus livros há sempre um glossário com palavras da nossa cultura popular, que pode ser utilizado nas aulas de português. Alguns jogos trabalham com noções da matemática, como dimensões e figuras geométricas. Muitas brincadeiras têm variações regionais, o que pode ser gancho para uma pesquisa sobre a diversidade cultural do nosso país. Por exemplo, na aula de artes, contar algumas lendas folclóricas às crianças e pedir que elas desenhem o que aprenderam. São muitas possibilidades!