Com criatividade, colégios públicos estimulam protagonismo de alunos e incorporam o “faça você mesmo” ao processo de aprendizagem
Com criatividade, colégios públicos estimulam protagonismo de alunos e incorporam o “faça você mesmo” ao processo de aprendizagem
Construir, consertar, modificar e fabricar os mais diversos tipos de objetos e projetos com as próprias mãos. O conceito do “faça você mesmo” existe desde a década de 50, mas com o advento da tecnologia digital e um acesso mais fácil a ferramentas antes destinadas a indústrias ou profissionais do ramo, a cultura maker vem conquistando cada vez mais adeptos no país.
No campo da educação, o movimento maker começou a ganhar espaço como uma prática para tornar o processo de ensino-aprendizagem mais criativo e envolvente. E se em algumas escolas particulares já existem laboratórios bem estruturados, em outras instituições nem sempre é possível contar um espaço exclusivo para os alunos colocarem a mão na massa.
Diante desse desafio, quais seriam os caminhos para introduzir a cultura maker em uma escola com poucos recursos à disposição?
Além do laboratório
As responsáveis pelo Instituto Catalisador, Simone Lederman e Rita de Camargo, acreditam que o primeiro passo é desmistificar a ideia de que a cultura maker só acontece dentro dos laboratórios com equipamentos de última geração. O Instituto é uma organização da sociedade civil que une profissionais de diferentes áreas interessados em trabalhar as transformações na educação, por meio dos princípios da aprendizagem criativa, unindo ciência e cultura com uma filosofia “mão na massa”.
“Ter um laboratório viabiliza muita coisa, mas não é condição necessária para a prática acontecer. É possível fazer coisas incríveis com arame, palito ou papelão e qualquer lugar da escola pode virar um espaço maker”, afirmam.
As educadoras citam como exemplo o desafio de implementar atividades “mão na massa” em duas escolas públicas de São Paulo: a Escola Estadual Silvio Xavier e a Escola Estadual Carlos Lacerda, localizadas no bairro de Pirituba, na zona norte da cidade.
O Projeto Pontapé, realizado em parceria com o Instituto MRV, que ajudou a viabilizar a iniciativa, propôs intervenções para melhorar espaços coletivos da escola, após ouvir educadores e estudantes. Dentre as ações realizadas em 2017, as escolas tiveram a revitalização da quadra, pintura de muros, produção de uma horta e até a construção de um palco, idealizado e colocado de pé pelos alunos.
O Fab Lab Livre SP é uma rede de doze laboratórios públicos espalhados pelo município de São Paulo, que oferecem diversos equipamentos voltados para a criação de objetos e ajudam a colocar em prática ideias criativas e inovadoras.
Os espaços são abertos para a comunidade e contam com uma agenda variada de oficinas e cursos livres gratuitos, ministrados por uma equipe multidisciplinar de engenheiros, designers, artistas visuais e arquitetos.
“Em um primeiro momento a sala de aula virou o espaço para geração de ideias. Aos poucos, fomos encorajando os alunos a colocarem as ideias no papel, trabalhar projetos tridimensionais e depois participar de todo projeto de execução e montagem. Ter algo construído para a escola e pelos próprios alunos também é movimento maker”, acredita Rita.
“Transformamos um espaço abandonado em um lugar aproveitável. Eu ajudei a limpar e fiz os cartazes de conscientização. Agora temos um lugar que todos cuidam”, comenta uma das alunas da Escola Carlos Lacerda.
Para os alunos da Escola Silvio Xavier, as atividades estimularam o trabalho em equipe e a autoconfiança. “Aprendemos a fazer coisas novas e a realizar ideias que tínhamos vontade. Não achávamos que seríamos capazes”, diz um deles.
Caminhos possíveis
O aumento de iniciativas “mão na massa” no país indica que a cultura maker está sendo incorporada no cotidiano das escolas e, aos poucos, considerada como um recurso de aprendizagem que pode ajudar no desenvolvimento de competências socioemocionais dos alunos, como pensamento crítico e autonomia.
Mas para além da mudança de mentalidade, que começa a transformar os ambientes educacionais, as educadoras indicam a realização de parcerias entre escolas e outros locais ou instituições como uma alternativa para a falta de recursos próprios.
“Os laboratórios e espaços makers podem ser grandes aliados. O fato de estarem próximos da comunidade estimula o conceito de espaços educativos além da escola, trazendo um elemento contemporâneo e uma troca muito bacana”, diz Simone.
Rita sugere também um olhar para os “makers da cidade”, pessoas que praticam atividades mão na massa no dia a dia de suas profissões, como costureiros, padeiros e marceneiros.
Rita e Simone reconhecem a importância de incentivar a tecnologia digital na educação, mas sem deixar de lado outros caminhos que podem ser trabalhados em conjunto.
“O mais importante é compreender o movimento maker como uma postura que alia cultura tradicional e tecnologia digital, valoriza o protagonismo do estudante e a construção de soluções e objetos reais que sejam significativos e compartilháveis”, concluem.