Com estreia marcada para março, Eleições acompanha jovens de uma escola pública de São Paulo na corrida pelo comando do grêmio estudantil
É tempo de eleições para o grêmio estudantil da Escola Estadual Doutor Alarico Silveira, localizada na zona oeste de São Paulo. Os alunos se organizam em quatro chapas com visões e opiniões distintas sobre como melhorar a escola. É justamente a riqueza do desenrolar desse protagonismo jovem que acompanhamos no documentário Eleições, dirigido por Alice Riff e viabilizado pelo Edital Videocamp de Filmes Transformadores.
Com estreia marcada para 14 de março em nove capitais do país, o longa mergulha no universo adolescente para acompanhar a construção de uma consciência política sobre o papel do aluno e da escola. Dos conflitos às relações de afeto e companheirismo, o filme transporta quem assiste para a realidade da juventude de uma escola pública, que sofre com os velhos conhecidos problemas estruturais: das goteiras imensas no teto, às salas de aula precisando de muitas melhorias.
Para captar a essência da potencialidade pelas câmeras, Alice e sua equipe passaram três meses, de fevereiro a abril de 2018, todos os dias na escola. Seguiram os passos dos quatro grupos que formavam as chapas de disputa: Chapa Rosa – formada só de meninas e que se propõe a lutar por pautas feministas -, P.A.S – composta pela turma do fundão que resolveu concorres às eleições para ‘sair da aula’ -, Identidade (ID) – liderada por Washington, que participa do grupo de jovens evangélicos fora da escola – e Mais Diversidade, formada majoritariamente pelo público LGBT+ da escola.
Apesar da diversidade das bandeiras, o desenrolar da corrida eleitoral evidencia a falta de posicionamentos e propostas consistentes. “Eu não entendi a diferença entre os grupos. Todos dizem só que vão trazer mais palestras”, questiona uma das alunas logo após o primeiro debate das chapas. Mas é justamente aí que está o encanto de Eleições.
Dos conflitos simples, como a música na hora do intervalo e o horário de fechamento do portão no início das aulas, vemos emergir a potência de uma juventude que vive na cultura da “lacração”, que tenta se afirmar ao mesmo tempo que constrói suas próprias referências e desenvolve um senso crítico dentro da escola.
“Pesquisamos muitas escolas para começar esse projeto, mas escolhemos o Alarico por ser uma escola em que os estudantes não tinham nenhuma ligação com o movimento estudantil organizado”, afirma a diretora Alice Riff. “Nosso intuito era narrar os assuntos da escola como eles aparecem para os alunos. É um filme para que a maior parte das escolas públicas do Brasil se sintam identificadas”.
A Fundação Telefônica Vivo acompanhou a pré-estreia do documentário em São Paulo, seguida por um debate sobre protagonismo jovem. Durante a mesa, Raquel Franzim, assessora pedagógica do Instituto Alana destacou que o filme é um feliz rompimento do imaginário social do jovem descompromissado, que não quer saber da escola. “A escola é um espaço de cultura viva. Eleições mostra que mesmo dentro dos limites de uma educação arcaica, os jovens criam culturas e, assim, criam e recriam uma série de formas de ser e de se fazer política”.
Além de estrear nos cinemas, Eleições poderá ser assistido pela plataforma Videocamp, que disponibiliza exibição mediante agendamento e para grupos de, no mínimo, cinco pessoas. Confira três motivos para assistir ao documentário:
1) Explora a construção de vínculos
Cafuné na cabeça do amigo da frente, enquanto o professor explica um conteúdo. Um grupo unido em uma partida amadora de vôlei. A tomada de partido de uma das meninas quando descobrem que alguém desrespeitou seus amigos. “Se quiserem me ver brava, mexam com as pessoas que eu amo, e isso incluí esses três”, declarou ela enquanto apontava para os colegas. São nuances que as lentes de Alice captam para mostrar como se dão as relações sociais entre os estudantes.
A pesquisa Juventudes na Escola, Sentidos e Busca: Por que Frequentam?, coordenada pelo Ministério da Educação, apontou que as amizades estão entre os principais motivos que prendem os jovens à escola. “Isso não é pouca coisa, porque o direito de aprender só acontece dentro das relações estáveis, de confiança, democráticas, positivas e empoderadoras do outro. A afetividade é a porta da aprendizagem e o documentário traz muito disso ao mostrar as construções de vínculo”, explica Raquel Franzim, do Instituto Alana.
2) Questiona as formas tradicionais de aprendizado
No documentário, um dos líderes da chapa P.A.S é questionado em debate sobre os motivos pelos quais ele deseja presidir o grêmio. Sincero, ele responde que a ideia inicial era fugir da sala de aula. Apesar de ficar claro que os membros da chapa compõem a clássica turminha do fundão, aquela que tira o sono dos professores, as câmeras mostram como até mesmo esses alunos conseguem se comprometer quando estão motivados.
“O questionamento que fica é por que a escola não consegue se comunicar com esses alunos? Será que eles não querem mesmo saber de nada? Como é que a gente trabalha com esses estudantes que não conseguem se concentrar na sala? Acho que temos bastante para refletir”, aponta a diretora Alice Riff.
3) Fortalecimento da escola como espaço democrático
Alice acredita que a maior contribuição de Eleições para os jovens é o entendimento de que a escola é também o espaço para questionar as coisas, para falar e ser ouvido, o que ela vê como algo extremamente potente na formação para a vida.
“O filme trabalha nessa potência da juventude e da escola como esse espaço democrático. O grêmio é uma forma de trabalhar uma série de competências, como falar em público, ter mais responsabilidade. Além disso, ajuda a aproximar um pouco mais os jovens da democracia. Por que a gente se sente tão distante de um vereador, por exemplo? Se a gente começa a ocupar os espaços democráticos na escola, no bairro, o nosso papel enquanto cidadão vai ficando mais claro”, defende Alice Riff.
Diretora Alice Riff orienta cinegrafista no documentário Eleições.