Saltar para o menu de navegação
Saltar para o menu de acessibilidade
Saltar para os conteúdos
Saltar para o rodapé

Confira a entrevista com Doug Alvoroçado, professor e ativista do uso das tecnologias para uma educação inclusiva, que compartilha exemplos inspiradores sobre como construir aulas para todos

#Educação#Entrevista#TecnologiasDigitais

Imagem mostra quatro estudantes em perspectiva, todos estão em sala de aula utilizando computadores

Pedagogo, professor, músico, especialista em Atendimento Educacional Especializado (AEE) e fundador da empresa Olhares Educação Inclusiva. Doug Alvoroçado tem muitos títulos, e todos eles convergem para o uso de tecnologias para uma educação inclusiva. E desde muito cedo ele se entende como um entusiasta das inovações tecnológicas. “Na infância, esse era um assunto que fazia meus olhos brilharem”, afirma.

Atualmente, Doug leciona para estudantes de Ensino Médio no Colégio Estadual Heitor Lira, no Rio de Janeiro. Também dá aulas de Tecnologia, Inclusão e Libras no Ensino Superior, nas instituições Pró-saber-Humaitá e Faculdade IELUSC. Além disso, atua na coordenação de Inovação e Tecnologia da Secretaria Municipal do Rio de Janeiro. Para ele, é preciso educar com, para e por meio das tecnologias, e isso está refletido em sua atuação profissional.

Apesar do avanço na legislação que versa sobre inclusão, como a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que desde 2015 prevê a adaptação na infraestrutura das escolas para pessoas com deficiência, o educador acredita que há um longo processo para que as determinações legais passem a fazer parte do dia a dia da educação. E esse processo pode ser facilitado com o apoio das tecnologias.

Em entrevista à Fundação Telefônica Vivo, Doug conta um pouco sobre sua trajetória na educação, dá exemplos de ferramentas digitais que podem facilitar a inclusão na escola e traz casos inspiradores sobre uso das tecnologias digitais em sala de aula. Confira a seguir:
 

O que significa uma educação verdadeiramente inclusiva?

Doug Alvoroçado: É uma educação de todos, para todos e sem nenhum tipo de barreira. A gente precisa ser acessível e ser inclusivo. Falar sobre inclusão não é só falar sobre pessoas com deficiência. O meu filho, que é uma criança atípica, está convivendo em sala de aula com uma aluna indiana, que também precisa estar incluída.

Essa inclusão tem que começar por nós. O professor que nunca recebeu um aluno cego precisa estar preparado para quando esse dia chegar. Eu vou nos lugares e me falam: “está faltando intérprete de Libras, mas hoje não tem nenhum surdo”. Eu respondo: “não tem hoje e nunca vai ter porque não tem Libras. Estamos negando espaço”. Ser inclusivo é antecipar os espaços.
 

Quais são as ferramentas e recursos que, na sua opinião, são as melhores para usar tecnologias digitais para uma educação inclusiva?

Doug Alvoroçado: Estou completamente apaixonado pelo Classroom Screen. É uma tela em que você pode colocar um dado, uma chamada, sinais. Parece um recurso muito simples, mas é perfeito porque é muito visual e tem medidor de barulho de sala de aula.

As ferramentas do Google for Education são incríveis! Eu falo muito delas. No Google Docs, você tem uma ferramenta para digitar usando comando de voz. Assim facilita para aquele aluno que ainda não foi alfabetizado ou que tem alguma deficiência. O Khan Academy trabalha a personalização de uma maneira muito tranquila, com coisas simples. Eu gosto muito de ferramentas de comunicação ampliada, como o Que-fala! e a Expressia. Existem muitas possibilidades de ferramentas.
 

Na sua opinião, quais são os maiores benefícios do uso da tecnologia a favor da inclusão? Pode citar alguns exemplos de como eles acontecem na prática?

Doug Alvoroçado: A primeira coisa que a tecnologia faz é engajar o aluno, porque ela traz mais recursos. Uma coisa é escrever no quadro – isso já é uma tecnologia. Outra coisa é usar um projetor, que me permite ter mais cores e movimento. Isso amplia o espectro da aprendizagem e aumenta o acesso aos conteúdos.

A tecnologia estimula a criatividade, amplia e trabalha com diversas habilidades diferentes. Quando bem utilizada, pode facilitar a socialização. Outro benefício é que a tecnologia pode facilitar a inclusão, a personalização e a individualização das práticas pedagógicas do professor em sala de aula.
 

Ao longo da sua experiência, teve algum caso que ficou marcado por demonstrar esse potencial da tecnologia para a inclusão?

Doug Alvoroçado: A tecnologia sempre esteve ao meu lado, complementando o currículo. Quando fui trabalhar na sala de recursos do Rio de Janeiro, tive a oportunidade de ter mais tecnologia à minha disposição e um grupo menor de alunos. Sendo assim, lembro muito bem de dois desafios. O primeiro foi com um aluno surdo de família ouvinte. Ele não falava Libras e tinha uma comunicação gestual muito básica. Com ele, passei a usar recursos como vídeo, desenhos e animações.

E outra vez foi com uma aluna com deficiência intelectual muito severa, e eu tinha que ensinar o conceito de bairro. Aí comecei a trazer para as aulas coisas como música, vídeo e Google Street View. Só percebi a diferença no desenvolvimento [da estudante] quando outros professores começaram a comentar comigo [sobre a diferença no desenvolvimento].

A Inteligência Artificial é uma tendência para os processos de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, como você entende as possibilidades oferecidas pela IA para a inclusão na educação?

Doug Alvoroçado: Eu acho que a Inteligência Artificial pode tornar o processo educacional mais inclusivo porque auxilia e facilita alguns processos. O professor pode pedir a ajuda da IA para adaptar uma aula para um aluno com deficiência, por exemplo. Ela pode apoiar no planejamento de uma aula melhor. Pode ser fonte de informação.

Uma coisa é pedir para um estudante que tem foco reduzido pesquisar na internet. Outra coisa é pedir para ele entrar no Chat GPT e solicitar informações sobre fotossíntese, por exemplo. Nesse caso, a plataforma vai dar um resumo estruturado e [o professor] pode usar isso como base para construir a educação desse aluno. Por isso, a inteligência artificial não é solução, é ferramenta para construção do planejamento, da aula, da educação e da experiência.
 

Como você analisa o cenário do uso das tecnologias para a inclusão na educação pública brasileira? É possível evoluir?

Doug Alvoroçado: O Brasil tem avançado significativamente. A legislação brasileira é vanguardista em muitas áreas e existem leis muito importantes para a inclusão. Porém, fazer isso entrar no cotidiano das pessoas é mais complicado. Por exemplo, aqui no Rio de Janeiro, onde moro, tivemos mais de 500 casos de escolas que negaram matrículas para alunos com deficiência.  Ou seja, é um processo demorado para chegar às pessoas e a gente precisa avançar.
 

Para você, qual é a importância da formação e capacitação de professores para uma educação inclusiva?

Doug Alvoroçado: A formação é importantíssima, seja ela primária, continuada, em serviço, para o título, mestrado, doutorado ou pós-graduação lato sensu. Em uma formação inicial, por exemplo, não é possível abarcar tudo o que é inclusão. À medida que os casos vão aparecendo, você vai se informando, buscando, se aperfeiçoando cada vez mais.

Então, a formação continuada, a capacitação, as troca de experiências, grupos de apoio e a possibilidade de contar com pares mais experientes sempre ajudam. Porque assim o professor terá contato com uma experiência exitosa ou uma experiência não exitosa, nas quais ele vai se inspirar.  Além disso, ao conhecer a teoria, vai conseguir aplicá-la em prática. Precisamos o tempo todo estar atentos para conhecer as novidades, as novas tecnologias e as estratégias do momento para trabalhar com a inclusão e com a educação inclusiva de uma maneira geral.
 

De que maneira você enxerga o futuro da educação a partir da adoção de tecnologias voltadas à inclusão?

Doug Alvoroçado: Se alguém entrar na minha mente, talvez vá se assustar! Eu acho que a gente não vai voltar para trás quando o assunto é tecnologias digitais. A minha ideia é que o futuro seja digital, verde e inclusivo. Só que temos que ser tudo isso da maneira correta. Sinto que precisamos educar hoje, no presente, para chegar nessa escola digital, que não é uma escola com computadores, é uma escola com tecnologias pulverizadas em todos os espaços. Não é uma escola com alunos incluídos, é uma escola para todos e por todos.

No início de fevereiro, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) anunciou a suspensão de aplicativos e plataformas sem fins educativos nas escolas da rede estadual. Já a rede municipal do Rio de Janeiro proibiu celulares nas escolas. Nesse cenário, você acredita que a proibição do uso de celulares nas escolas pode influenciar a adoção de tecnologias em prol da inclusão? De que forma?

Doug Alvoroçado: Se a tecnologia é uma ferramenta de inclusão, a proibição dessas ferramentas significa um retrocesso. É óbvio que o celular é uma caixa de Pandora. Tem muitas coisas boas e outras complicadas. Nós precisamos urgentemente de uma educação com tecnologias, para as tecnologias e por meio de tecnologias.

Sendo assim, não concordo com a proibição, eu concordo com a educação. E a educação, muitas vezes é eu dizer, por exemplo, que em certos espaços não vai ter [uso de celular]. Pensa comigo: quanto de dinheiro meu aluno gastaria para comprar uma câmera fotográfica, uma calculadora e uma televisão? Mas se ele tem um celular, tem tudo isso no bolso, e não posso perder a chance de trabalhar com isso.

Como a tecnologia pode ser usada para uma educação mais inclusiva?
Como a tecnologia pode ser usada para uma educação mais inclusiva?