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ARTIGO 31/LIVRO 1 – TEMA: FAMÍLIA

 

Comentário de Luiz Paulo Santos Aoki

Ministério Público/São Paulo

Este artigo,de expressiva conotação de excepcionalidade, impede até mesmo que se visualize a guarda temporária no caso do estágio de convivência previsto no art. 46, §2°, do Estatuto da Criança e do Adolescente quando o estrangeiro cumpre o estágio exigido pela lei, o que, na realidade, trata-se de verdadeira articulação jurídica para evitar que o pretenso adotante possa pleitear eventual direito sobre aquela criança ou adolescente, quando o que a lei permite é apenas uma expectativa de direito.

Tal excepcionalidade afirmou-se ainda mais com a recomendação oriunda do XIII  Congresso da Associação Internacional de Magistrados de Menores e de Família, realizado em Turim, Itália, em setembro/90, com a seguinte emenda: “Que seja confirmado o caráter subsidiário da adoção internacional à qual se poderá recorrer somente depois de esgotadas todas as possibilidades de manutenção da criança na própria família ou em outra família no seu país de origem”.

Em que pese ao esforço do legislador em excepcionar a colocação da criança e do adolescente em família substituta estrangeira, não nos esqueçamos de que somos quase todos, em imensa maioria, no Brasil, oriundos das mais diversas raças deste planeta, pois é conhecida e propalada a ampla miscigenação havida neste País, sendo de estranhar-se uma regra de excepcional idade constituída pelo simples fato de o pretenso adotante tratar-se de estrangeiro.

Outros motivos – tais como a privação da interação com aqueles igualmente ligados pela mesma origem, história, tradições e lembranças, cultura, interesses e aspirações, e o rompimento dos vínculos com sua terra, sua gente, sua cultura, sua civilização, além de uma falsa expectativa de bem-estar no Exterior, fundada em esperanças e probabilidades sem quaisquer garantias de que se realizarão ou de que sejam verdadeiras, ou até mesmo o não se poder prever se as crianças ou adolescentes adotados por estrangeiros não serão futuros combatentes nas violentas guerras que assolam o Oriente Médio, ou utilizados em ações beligerantes na Ásia ou América Central, ou vítimas de terrorismos na Europa, pois mesmo os chamados países desenvolvidos possuem problemas sociais, havendo segmentos que enfrentam a pobreza, o desemprego e a marginalidade são argumentos lembrados para justificar tal postura legislativa.

Não se deve, portanto, pender do extremo da xenofobia ao extremo da xenofilia, sem o exame caso a caso, mormente das condições do pretenso adotante, bem como do adotado.

Posição mais sensata encontramos esposada no trabalho publicado sob o título “A criança e o adolescente na Constituição Federal”, de autoria do brilhante Promotor de Justiça e Professor de Direito do Menor Dr. Paulo Afonso Garrido de Paula, in Cadernos Fundap 18/13, São Paulo, ano 10, agosto/90: “Dificultar a adoção internacional, aproveitando-se da regulamentação determinada pelo legislador, também não nos parece o melhor caminho, ante a realidade brasileira e a necessidade de solucionar situações concretas. O mais sensato seria tratar a adoção internacional como exceção das exceções, uma vez que o adequado seria que cada criança e adolescente fosse criado e educado pelos seus próprios pais biológicos e, não sendo isso possível, esgotar as tentativas de colocação em lar substituto brasileiro. Assim, exauridas tais tentativas e afastadas as possibilidades de decisões temerárias ante uma clara regulamentação dos requisitos básicos e da forma de acompanhamento do processo de adaptação, a adoção internacional, em casos excepcionais, poderia resolver situações especiais. Ao contrário, querer facilita-la ao máximo é legalizar a exportação da miséria.”

Na prática, contudo, a excepcionalidade pouco atinge os casos de adoção internacional, resguardados em sua maioria para aquelas crianças ou alguns poucos adolescentes já preteridos há muito tempo pelos casais nacionais, que ainda guardam o preconceito, em sua maioria, de adotar apenas recém-nascidos, e normalmente de pais conhecidos, além de outros resquícios de preconceitos de todos conhecidos.

Bem andou, por outro lado, o legislador ao permitir que a colocação em família substituta estrangeira só se consumasse na modalidade da adoção, o que significa maior garantia para o adotado, que não mais sairá do País em situação precária, passível de revogação. Muito embora faltante, ainda,o advento de regras que estabeleçam a necessidade de prova do texto e vigência da legislação referente à adoção do país de origem dos pretensos adotantes, permitindo,assim,conhecer-se a situação jurídica de que desfrutará a criança ou adolescente no Exterior – uma vez que vários países impõem restrições à aquisição da cidadania, transformando-se o nacional adotado em cidadão de segunda ou terceira categoria- pode-se obter, comum pouco de insistência, sopesando exatamente os argumentos acima, a comprovação da legislação vigente, devidamente traduzida por tradutor juramentado, contendo informes seguros sobre a situação jurídica da criança ou adolescente ao ingressar no solo estrangeiro.

Vale lembrar, outrossim, que a família estrangeira que resida no Brasil terá tratamento isonômico, segundo preceito contido no art. 5° da CF, estando, portanto, livre para pleitear a guarda, a tutela e até mesmo a adoção, como qualquer família brasileira.

Entretanto,o estrangeiro que resida ou esteja domiciliado fora do País não pode pleitear a guarda ou a tutela, mas tão-somente a adoção, observados os preceitos dos arts. 46, § 2°,e 51 e 52, em especial.

 

Este texto faz parte do livro Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, coordenado por Munir Cury
ARTIGO 31/LIVRO 1 – TEMA: FAMÍLIA

 

Comentário de Maria Josefina Becker

Assistente Social/Porto Alegre,RS

Encontramos,aqui, a excepcional idade sobre a excepcional idade. O art.19 considera, genericamente, a medida de colocação em lar substituto como exceção, dentro do direito à convivência familiar e comunitária.O art.31, integrante da seção “Da família substituta”, considera que, dentro dessa medida, já em si excepcional,encontra-se,em relação a ela novamente excepcional, a colocação em família substituta estrangeira, somente admissível na modalidade de adoção.

A Convenção dos Direitos da Criança, ratificada pelo Brasil, e, por conseguinte, com força de lei, assim se expressa: “(Os Estados) reconhecerão que a adoção por pessoas que residam em outro país pode ser considerada como outro meio de cuidar da criança, no caso em que esta não possa ser colocada em um lar sob guarda ou entregue a uma família adotiva ou não possa ser cuidada de maneira adequada no país de origem” (art. 21, “b”).

Percebe-se, logo, que muitos caminhos devem ser percorridos antes da decisão pela medida de colocação em família substituta estrangeira.

Esgotadas todas as possibilidades de manutenção do vínculo com a família natural e buscadas, sem sucesso, formas de colocação da criança ou adolescente na sua comunidade e em seu próprio País, considera-se a hipótese da adoção por estrangeiros.

Os cuidados manifestados pelo legislador brasileiro e pela ONU são plenamente justificados se considerarmos diversas questões relativas à matéria:

– A adoção internacional vem crescendo no mundo contemporâneo e adquire, cada vez mais, uma característica que inverte suas verdadeiras finalidades. Deixam-se de lado os interesses e direitos da criança para buscar satisfazer os desejos e “necessidades” culturalmente criadas de adultos, inférteis ou não, que vêem na criança um objeto para a sua própria satisfação.

– As agências internacionais, sediadas em países desenvolvidos, em sua maioria, exercem pressões cada vez mais intensas sobre os países do Terceiro Mundo, contribuindo para que famílias empobrecidas entreguem suas crianças com vistas ao “paraíso” de que desfrutarão no futuro.

– As facilidades da adoção internacional desestimulam programas locais de prevenção do abandono e também a articulação entre os serviços nacionais de colocação familiar com vistas a manter no Brasil as crianças brasileiras.

– São crescentes as notícias referentes à vinculação de algumas agências de adoção com grupos criminosos que se dedicam ao tráfico e à venda de crianças.

– Os resultados da adoção internacional, a médio e longo prazos, são pouco conhecidos e há indicadores de que nem sempre são favoráveis, sobretudo na adolescência e na idade adulta.

É importante levar em conta, também, a Convenção de Haia relativa à Proteção e Cooperação em matéria de Adoção Internacional, adotada, inclusive pelo Brasil, em 10 de maio de 1993. Esse Tratado foi elaborado com o objetivo de colocar em prática o art. 21, letra “e”, da Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança, e foi ratificado pelo Congresso Nacional em 14.1.1999 e promulgado pelo Decreto 3.087, de 21.6.1999.

 

Este texto faz parte do livro Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, coordenado por Munir Cury

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ECA comentado: ARTIGO 31/LIVRO 1 – TEMA: Família
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