Saltar para o menu de navegação
Saltar para o rodapé
Saltar para os conteúdos
Saltar para o menu de acessibilidade

Conheça a história de quem empreendeu dentro e fora das aldeias, valorizando os costumes indígenas de gerações anteriores e as riquezas de seus territórios

Luakam idealizadora das bonecas Anaty

 

Segundo levantamento do IBGE , uma população indígena brasileira representa mais de 817 mil pessoas, em mais de 300 etnias. Cada um destes povos tem seus próprios saberes e modos de enxergar o mundo, mas compartilham o respeito e o amor pelas terras em que vivem.

Ainda que sustentando a ligação com a ancestralidade e com meio ambiente, onde estes grupos crescem e se fortalecem na comunidade, a imagem herdada do processo de colonização em que os indígenas viviam seminus, com cocar na cabeça, vivendo da caça e da pesca, não refletem uma realidade.

A riqueza do conhecimento que possui, somada à especialização em áreas diferentes, vão muito além do estereótipo e exibição que a arte de empreender tem trazido resultados positivos para as comunidades reafirmarem sua identidade como indígenas.

O grafismo virou Ateliê Terena

Edenilson Dias Delgado tem 25 anos. De pai de etnia terena e mãe negra, o afro-indígena frequentou recentemente o sonho de abrir o próprio ateliê, que o acompanhava desde a adolescência.  Sou apaixonado por moda e a ideia de criar o ateliê veio aos meus 14 anos de idade, quando eu passava horas e horas desenhando e criando looks”, conta o artista.

Dos primeiros croquis feitos por Edenilson, veio a primeira decepção. Em 2012, uma pessoa disse que iria ajudá-lo a montar sua própria marca. “Comprei os materiais, canetas profissionais, montei meu portfólio com os croquis de modelos, investi e desenhei minhas inspirações, e essa pessoa sumiu com meu trabalho. Aí desisti ”, explica.

Edenilson Dias Delgado

Edenilson continuou no mundo da arte, mas dessa vez foi para a dança e o teatro. “Fiz jazz e dança contemporânea, depois artes cênicas. Trabalhei com fotografia também ”.

Em 2019, a vontade de seguir no ramo da moda falou mais alto. Ele voltou a desenhar e aproveitou o talento, passado pela avó, para costurar também. “Eu tenho um irmão gêmeo e minha avó sempre pessoas iguais para a gente. Quando ela fabrica como roupas, eu sempre observava para aprender ”. Edenilson aprendeu a costurar aos 13 anos de idade.

No final de 2020, em plena pandemia, Edenilson investiu em seu sonho e abriu o Ateliê Terena . “Minha mãe Ana Raquel e minha avó Tereza viram meu trabalho e resolveram me apoiar financeiramente para abrir a marca.”

Quando lançadas como primeiras peças femininas, em fevereiro de 2021, ele queria mostrar que todos podem usar como roupas com grafismo terena. “Cada grafismo tem seu significado. Eu sempre coloco nas peças de roupa a explicação de cada um. E quero que todos usem, sem medo de ferir a nossa cultura. O intuito foi levar a visibilidade do meu povo, da minha etnia e das demais através da moda ”.

O trabalho está a todo o vapor. Edenilson desenha, costura e tira como fotos de divulgação das peças. “Eu sempre falo que nada vem fácil, ainda mais para nós indígenas. Eu sempre corri atrás de tudo e não vou parar. E para o futuro, eu quero que minha marca seja reconhecida no mundo inteiro, para que as pessoas conheçam meu trabalho e o meu povo ” , finaliza.

O sonho das bonecas Anaty

Luakam é do povo Anambé, que fica às margens do Rio Moju, no estado do Pará. Oitava filha de 15 irmãos, ela foi trabalhar, ainda criança, junto com duas irmãs, na casa de um fazendeiro, em troca de um lugar para dormir e de comida.

Como as outras irmãs eram mais velhas, logo elas foram embora da fazenda e Luakan teve que continuar. Maus-tratos de Sofria, abusos e violências. Não teve infância nem brinquedos. Por isso, uma imagem nunca saiu de sua cabeça e virou uma determinação para sua vida.

 

Boneca Anaty feita por Luakam Anambé

Um dia, a mulher do patrão a levou numa feira e ela viu uma boneca pela primeira vez na vida. “Negaram a boneca que pedi. Quem tinha que trabalhar era proibido de brincar. Quando eu era pequena, prometi que quando crescesse, iria fazer uma boneca para mim”, relembra.

Ela se casou aos 14 anos e só assim pode ir embora da fazenda. O casamento de Luakam também era coberto de agressões. “Por isso, eu peguei meus dois filhos pequenos e fui para o Rio de Janeiro, em busca do meu sonho de costurar para grandes estilistas”.

Enquanto fazia faxina para sobreviver, conseguiu criar os filhos e formou uma nova vida na capital fluminense. Completava a renda participando de feiras de artesanato na cidade.

O tempo passou e aos 43 anos, em uma das feiras, uma das artes de Luakam chamou a atenção do público, mas não estava em exposição. Era a boneca de pano, que sua neta de 7 anos, Anaty, carregava. “Só depois que minha neta nasceu eu realizei o sonho de fazer uma boneca de pano para ela”, relembra.

Neste ano, Luakam investiu todas as economias para fabricar as bonecas Anaty que venderia numa feira em abril, quando veio a pandemia. Com receio dos planos serem interrompidos, a neta teve a ideia de postar um vídeo nas redes sociais e foi um sucesso. “No final de 2019, a gente tinha mil reais na conta. A gente usou todo o dinheiro que tinha para comprar material para fazer as bonecas e começamos a trabalhar dentro de casa, focada nessa produção”, nos diz.

Para a artesã, o empreendedorismo serve para empoderar as mulheres nas comunidades indígenas. “A gente quer trazer a autoestima das mulheres, fortalecer nosso território. As bonecas vieram para descolonizar esse processo, que está aí há 521 anos. O segredo é valorizar o curumim (as crianças). A gente espera que a partir dela, esse preconceito acabe”, enfatiza.

Hoje, Luakam se organiza para abrir uma organização de mulheres em Mato Grosso do Sul, nas aldeias, para continuar a produção. Ela vende mais de 600 bonecas por mês. “Espero realizar o sonho das crianças e valorizar as mulheres, para que não sofram como eu sofri.”

 

Os filhos do Waraná

O projeto Guaraná de Sateré-Mawé nasceu em 1993, na Terra Indígena Andirá Marau, nas divisas do estado do Amazonas e do Pará. A semente waraná, de onde o guaraná é feito, garante o sustento para 338 famílias atualmente.

Sérgio Wará-Sateré é Presidente do Consórcio dos Produtores de Sateré-Mawé e começou a seguir os caminhos do pai aos 16 anos. “A gente não veio de uma família de gerações de lideranças. Mas o meu pai, na geração dele, foi vereador, secretário-geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e ele foi o idealizador do projeto waraná”, conta.

Filhos do Waraná

Com a produção dessa semente rica, que é o waraná, sem agrotóxicos e respeitando a natureza, os indígenas da Aldeia Andirá-Marau plantam e levam não só o guaraná para fora do Brasil, mas toda a cultura de seu povo. “O projeto surgiu porque, mitologicamente, o povo Sateré nasceu do Waraná. Então toda a nossa história, política, educação, forma social de viver, está dentro do waraná, que significa o princípio da sabedoria”, explica Sérgio.

Com isso, os indígenas conseguem fazer com que a terra seja produtiva de uma forma responsável, sem degradar e destruir o ambiente. “O nosso território indígena é o único banco genético natural do mundo do waraná. Isso é uma forma de dizer para o mundo que nós existimos, de dizer para o mundo que nós estamos trabalhando de uma forma responsável para que todos sejam beneficiados.” [destacar]

Os Sateré-Mawé mandaram 20 quilos do produto para a Itália em 1993, lote que foi reconhecido como o melhor waraná do mundo. Assim, eles ganharam visibilidade. “Hoje nós temos duas empresas: a da Itália, e a Guaiapí, na França, que recebem nossos produtos. A gente não vende o waraná. A gente vende o projeto político de vida de um povo”.

Os jovens da Aldeia estão se especializando para cuidar da parte administrativa do consórcio. “É bom, porque essas novas gerações estão começando a enxergar essas oportunidades na área indígena, que podemos trabalhar e criar, dentro de nossas terras, sem destruir e aproveitando o talento dos nossos territórios”, diz.

Empoderar jovens indígenas

Nascida a partir da ideia de jovens apaixonados por Empreendedorismo, Tecnologia, Marketing e Cidadania, o Go Future visa a inclusão social e tecnológica de adolescentes de comunidades mais esquecidas como indígenas, ribeirinhas, caiçaras, entre outras que necessitam de maiores incentivos e iniciativas de fomento ao desenvolvimento socioeconômico.

“Baseado em valores como progresso e igualdade de oportunidades, o projeto significa literalmente “vá para o futuro” e pretende não apenas mudar a situação econômica daqueles que estão inseridos nos diferentes contextos sociais mais vulneráveis, mas também incentivar o compartilhamento de diversos conhecimentos e culturas”, explica Karina Martins, fundadora do Go Future.

Projeto Go Future leva empreendedorismo para jovens indígenas

O Go Future tem como um dos pilares os ODS, os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU). Portanto, está em concordância com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, que procura erradicar a pobreza e promover vida digna para todos. “Cinco aldeias indígenas de Peruíbe, em São Paulo, já foram beneficiadas com o Go Future, que já contou com jovens de Ensino Médio e Ensino Fundamental, além de professores, participando das oficinas de empreendedorismo social e tecnológico”, enfatiza Karina.

Peruíbe atualmente conta com 12 aldeias indígenas, onde o O Go Future atua. Para Karina, um dos momentos mais marcantes foi a ação feita na aldeia Awa Porungawa Dju. “Apoiar o empreendedorismo dentro dessas comunidades é necessário para que eles possam empreender e prosperar com projetos relacionados à sua cultura, como venda de cursos, vivências na aldeia, artesanato, produtos medicinais, dentre outros” , comemora .

Empreendedorismo Indígena: Artesanato, moda e natureza
Empreendedorismo Indígena: Artesanato, moda e natureza