Crédito: Marcello Casal Jr./Agência Brasil
Ana Luísa Vieira, do Promenino, com Cidade Escola Aprendiz
Dúvidas? Mande suas questões!
Para ajudar no esclarecimento das dúvidas, o Promenino responderá mensalmente, até as eleições de outubro, às principais questões dos leitores em relação à eleição nacional. Contaremos com a colaboração dos especialistas Luciano Betiate (do Portal do Conselho Tutelar) e Daniel Péres (da página Fala, Conselheiro!). Participe! Clique aqui e nos envie suas perguntas. As mais frequentes serão respondidas em reportagem especial no próximo mês.
A mudança promovida pela Resolução 170/2014 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) tem tirado o sono de muitos conselheiros tutelares Brasil afora. No dia 27 de janeiro deste ano, o Diário Oficial da União publicou o ato normativo 170, que define as linhas gerais para o Primeiro Processo de Escolha Unificada dos Integrantes dos Conselhos Tutelares.
De caráter nacional e com a participação dos 5.946 conselhos tutelares, a eleição se realizará no próximo mês de outubro. A posse dos novos profissionais, que terão mandato de quatro anos e meio, está marcada para janeiro de 2016. Divulgada por Ideli Salvatti, então ministra da Secretaria de Direitos Humanos (o comando da pasta passará para Pepe Vargas), a notícia ainda é ruidosa para os atores do Sistema de Garantia de Direitos.
De acordo com o consultor e conferencista Luciano Betiate , ex-conselheiro tutelar da cidade de Ibiporã (localizada a 7 km de Londrina, no Paraná), unificar a eleição “trouxe mais sofrimento, mais dúvidas e mais turbulência do que benefícios”. Diz ele: “Se eu dividir em duas páginas os benefícios e os transtornos, o espaço para os transtornos será muito maior”.
Ao Promenino, ele contou receber, “dia e noite”, ligações de colegas que não sabem o que fazer em relação às eleições unificadas. “Estou sendo sincero: até hoje, não consegui entender qual é a demanda que o Conanda quis atender com a eleição nacional. Os municípios criaram seus conselhos e estava tudo correndo muito bem, de maneira tranquila. O único desconforto no processo de escolha municipal é que, vez ou outra, tinha de ser adiado e coincidia com eleições estaduais ou mesmo a federal, o que tornava o processo confuso”, explica.
“De qualquer maneira, enxergo um ponto positivo: unificar a eleição dará visibilidade aos Conselhos Tutelares. A mídia cobrirá o processo e as pessoas terão mais conhecimento sobre a atividade”, pondera.
Fala, conselheiro!
Nesta primeira reportagem da série sobre o processo unificado das eleições, o Promenino reuniu algumas dúvidas recebidas por meio do canal Fale Conosco. Contou também com a ajuda da página Fala Conselheiro!, administrada pelo professor Daniel Péres, conselheiro tutelar da Comarca de Guapimirim (RJ) e diretor da Associação de Conselheiros e Ex-Conselheiros Tutelares do Estado do Rio de Janeiro (ACTERJ). Confira, abaixo, as perguntas e os esclarecimentos de Luciano Betiate.
1. É preciso ter Ensino Médio completo para se candidatar?
“Não exatamente. O Conanda sugere isso, mas não cria regras porque não tem tal competência. Ela é estabelecida em lei federal, lei estadual ou nas leis municipais. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi bem econômico ao dizer que o candidato deveria ter ‘idoneidade, mais de 21 anos e residir no município’. As orientações estaduais e municipais acabam por se complementar. O Conanda não pode estabelecer uma regra para um município obedecer – afinal, o próprio ECA diz que a regra estará na lei municipal. É uma questão que cria conflitos, porque muitos municípios ou não exigiam nada (quem tinha de 1ª a 4ª série, 5ª a 8ª podia se candidatar) ou cobravam Ensino Superior nas áreas de Pedagogia, Serviço Social, Pedagogia ou Sociologia, como acontece em Campo Mourão (Paraná) há três mandatos.”
2. O conselheiro que está em seu segundo mandato completo pode se candidatar de novo?
“Essa é uma das perguntas que mais ouço. E a resposta é fácil: não, não pode. Essa regra não mudou. Quem está no segundo mandato consecutivo e completo somou seis anos, portanto, não pode mais. [O Conanda estipula quatro anos e meio de atuação].
Trocando em miúdos
A principal dúvida do conselheiro tutelar, hoje, é saber se ele pode ou não se candidatar. É o que afirmam os especialistas ouvidos pelo Promenino. Daniel Péres, da página Fala Conselheiro!, detalha a questão:
“Quando o ECA foi alterado em 2012, pela lei 12.696, no ponto em que tocava a respeito da recondução, unificou-se a data [para a eleição] nacionalmente. Contudo, existiam vários mandatos em curso iniciados em anos diferentes, em cidades distintas. E a lei 12.696 não previu como se daria isso na prática – se todos os mandatos seriam prorrogados ou não. Por isso, o Conanda se reuniu e expediu a Resolução 152, que previa o chamado mandato tampão. Ou seja: para aqueles que estavam terminando seus mandatos em 2012, ou no início de 2013, e tinham direito a mais uma recondução, faria-se um processo de escolha com menos de três anos. Se essa pessoa ainda tivesse o direito à recondução, esse mandato não seria computado. Logo, ela poderia, após o mandato tampão, participar do processo de escolha unificado. Essa resolução previa que, em 2014, não poderia haver nenhum processo de escolha – logo os mandatos que terminassem em 2014 ou início de 2015 deveriam ser prorrogados. Muitas cidades, porém, não respeitaram a resolução e vários companheiros foram prejudicados.”
Na esteira do raciocínio, Luciano Betiate completa: “Não sei se há uma luz no fim do túnel. O problema é que o trem pegou velocidade, passou pelo túnel da escuridão e saiu do outro lado, sem luz. Os editais já estão acontecendo e ninguém veio com um instrumento certo para colocar as regras. Qual seria o instrumento certo? Uma lei”, diz.
3. Os conselheiros que passaram por processo de escolha em 2014, contrariando a Resolução 152 do Conanda, poderão participar do processo de outubro de 2015? Aqueles que participaram em 2013 terão direito à recondução?
“À recondução, não. Eles não continuam, não podem. Nós temos duas Resoluções do Conanda que trataram desse assunto e aqui está o problema: na Resolução 152, o Conanda orientou os municípios no seguinte sentido: ‘mandatos com duração menor do que três anos, ou seja, mandatos que tiveram a duração prejudicada, não serão computados para a reeleição’. Ele orientou e todos os conselheiros que decidiram participar do pleito seguiram essa orientação. Aí vem a Resolução 170 e diz o contrário, com a regra dos quatro anos e meio. É um dos rangeres de dentes que a gente tem escutado. Com exceção de Minas Gerais, que tem uma lei própria e é exatamente essa dos quatro anos e meio, na minha opinião de consultor dos direitos, vale focar na Resolução 152. É o acordado com os conselheiros tutelares do Brasil todo. A Resolução 170 vem revogar a Resolução 152 e isso é injusto. É garantido aos conselheiros, na liberdade que lhes compete, entrar com mandado de segurança para garantir a sua inscrição. Que a Justiça avalie se há mesmo o direito, pois a 152 diz uma coisa e a 170, outra. Eu penso que os Conselhos Tutelares vão ter sucesso [no sentido de quem entrar na Justiça para garantir a sua inscrição].
4. Há uma lei capaz de definir quais são os critérios para se candidatar ao processo de escolha do Conselho Tutelar para todo o Brasil ou continua valendo a lei municipal?
“O município é quem decide os quesitos. É preciso buscá-los na sua lei municipal. A regra, eu repito, tem de estar na lei federal, estadual ou municipal. No caso dos quesitos, a lei federal estabeleceu três [idoneidade, mais de 21 anos e residir no município] e deixou com que os municípios se interessassem e fizessem outros atos normativos. O município é competente para acrescentar quesitos, só não se pode acrescentar coisas como ‘teste de admissão física’ ou dizer que deficientes visuais e auditivos não podem ser conselheiros. Claro que podem! Já encontrei em uma lei municipal a idade máxima de 45 anos – isso é um absurdo. O conselheiro tutelar tem de ter acima de 21 anos. Ele precisa ter carteira de motorista? Não. O conselheiro tutelar não precisa saber dirigir para tratar de direitos – neste caso, é o município tentando economizar dinheiro público, fazendo com que o profissional fique também responsável pelo transporte. É preciso estar atento.”
5. Pelo fato de a data do processo de escolha do Conselho Tutelar ser unificada em todo Brasil, as pessoas vão poder votar em urnas eletrônicas?
“Neste aspecto, o Conanda fez a coisa certa, ao definir que o Conselho de Direitos que tiver interesse em uma urna eletrônica deverá procurar o Cartório Eleitoral para ver se existe a possibilidade. Municípios como o meu [Ibiporã], por exemplo, não querem mexer com urna eletrônica, acham que pode haver confusão e acreditam que a votação funciona melhor em cédula simples. Na Resolução 170, há momentos em que a municipalidade é respeitada.”
Leia a íntegra da Cartilha recém-lançada pela Secretaria de Direitos Humanos sobre o processo de escolha em data unificada dos membros dos conselhos tutelares.
6. É possível votar em cinco candidatos diferentes ou em apenas um?
“Nós tínhamos vários formatos até então. Eu conheci poucos municípios que faziam chapas. Isso foi vetado, não pode mais. Outro formato mais comum é o individual – mas o eleitor não escolhia um só conselheiro: elegia cinco, seis, dois – isso é o município quem decide. Na minha cidade, por exemplo, até então votava-se em cinco, mas agora o CMDCA [Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente] determinou que o eleitor vote apenas em um. É mais fácil para contar o voto.”
7. Qualquer cidadão pode eleger seu conselheiro tutelar?
“Sim. Basta ter título de eleitor e estar em dia com suas obrigações eleitorais. Abre-se uma seção especial em lugares distintos, pois, no máximo, 45% de eleitores comparecem no dia, de acordo com uma pesquisa recém-debatida em Brasília. Provavelmente, o governo federal fará propagandas às vésperas da eleição.”