Evento da Fundação Telefônica e da Folha de S. Paulo reuniu especialistas para falarem sobre os desafios de transformar e inovar o cenário educacional do país.
Evento da Fundação Telefônica e da Folha de S. Paulo reuniu especialistas para falarem sobre os desafios de transformar e inovar o cenário educacional do país.
Em um país onde crianças e tigres têm que aprender a nadar muito cedo, por conta das inundações em Bangladesh, a escola é que se move até os alunos; esse é o projeto Shidhulai, onde barcos-escolas atendem comunidades fluviais. Do outro lado do mundo, na movimentada Califórnia, a escola High Tech High não parece um estabelecimento educacional. Alunos e mentores desenvolvem pontes, robôs e outros projetos que façam seus olhos brilharem.
Estas são apenas duas das experiências relatadas pelo escritor espanhol Alfredo Hernando Calvo no livro Viagem à Escola do Século XXI – Assim Trabalham os Colégios Mais Inovadores do Mundo. A publicação, disponível para download gratuito no site da Fundação Telefônica Vivo, vai além das histórias sobre as 80 escolas visitadas nos 21 países percorridos pelo autor. Funciona também como inspiração para gestores, professores e alunos buscarem a inovação em seus próprios cotidianos.
“Se queremos a inovação para as escolas do século XXI, temos que criar repertório. É esse o trabalho apresentado por Alfredo”, introduziu Mila Gonçalves, gerente de Projetos da Fundação Telefônica Vivo, no lançamento do livro, que aconteceu durante o Fórum Inovação Educativa, realizado junto à Folha de S. Paulo. Durante os dias 22 e 23 de novembro, especialistas em educação debateram como a tecnologia e outros tipos de inovação podem transformar o cenário educacional brasileiro.
Na abertura do evento, o diretor presidente da Fundação, Americo Mattar, falou da importância de se escutar uma juventude com vontade de modificar o seu entorno: “O jovem quer conquistar, quer participar e transformar a educação. Temos que escutá-los e permitir que sejam protagonistas de seus percursos de aprendizado”.
As mesas que compuseram o primeiro dia de diálogo falaram sobre o que deseja essa juventude. A diretora do Instituto Inspirare, Anna Penido, apresentou a pesquisa Nossa Escola em (Re)construção, que ouviu 132 mil jovens do país e seus anseios para uma escola inovadora. Anna pontuou que os movimentos de ocupação, que tem acontecido pelas escolas de todo país, são uma indicação do descontentamento dos 6 em cada 10 jovens que não encontram significado dentro da escola. Ainda segundo a pesquisa, 72% dos entrevistados querem participar mais ativamente da construção de novas formas de aprendizagem.
Esse dado demonstra o lugar da tecnologia dentro do processo educativo. O programador-educador Juliano Bittencourt compartilhou experiências em que alunos recorriam à tecnologia para solucionar problemas em seu entorno.
O desejo da juventude de participar não somente das decisões que concernem sua escola, como também das que regem políticas públicas educacionais, ficou visível na fala de Tábata Amaral. Com apenas 23 anos, ela é criadora do Mapa Educação, um movimento de jovens que luta pela universalização do acesso à educação e também sua profunda transformação. “Questionamos por que um jovem deve aprender fórmulas que poucas vezes usa, e não saber o que faz um vereador”. Ela dividiu seus anseios com o representante do Ministério da Educação (MEC), Rossieli Soares, que respondeu perguntas sobre as polêmicas reformas previstas para o Ensino Médio.
O segundo dia de seminário colocou em xeque a formação necessária para um professor inovador. Priscila Cruz, do Todos pela Educação, apresentou um perfil do docente brasileiro: são mais de dois milhões de professores que trabalham em uma malha educacional diversa e muitas vezes distante de sua realidade de formação. “Esse professor tem a inovação como prerrogativa; ele sempre tem que ser inovador para enfrentar a precarização de sua profissão”, destacou Cesar Callegari, do Conselho Nacional de Educação. Ele e seus companheiros de mesa, os educadores José Moran e Elie Ghanem, concordaram sobre a necessidade absoluta de dar importância, apoio e liberdade criativa para esse profissional. Callegari também defendeu a continuidade de investimentos da educação, sem os quais, alegou, não é possível imaginar uma formação inovadora para educadores.
O último painel trouxe perspectivas, desafios e experiências sobre educadores que trabalham em ambientes inovadores. Tendo como ponto de partida a EMEF Campos Salles, na comunidade de Heliópolis, em São Paulo, onde alunos aprendem por projetos transdisciplinares, os debatedores falaram de uma escola que tenha significado não somente para o aluno, como também para que o educador se mantenha motivado a inovar. Para tanto, é necessário diminuir distâncias entre esse professor formado tradicionalmente e o aluno pronto para trilhar novos caminhos. O diretor do Instituto Singularidades, Miguel Thompson, falou que se deve entrar em um tempo de diálogo e abandono de tradições. “A escola é o equipamento mais próximo que o Estado tem do jovem, mas nós não conhecemos esse jovem e não aproveitamos o que eles querem nos ensinar”.
A socióloga Helena Singer provocou a plateia ao perguntar o porquê de a escola ainda seguir o modelo tradicional. “Não há lei que diga que as escolas devem ter carteiras enfileiradas, com disciplinas separadas e classes seriadas. Temos que nos perguntar o porquê da inovação acontecer pouco, e o que temos que fazer para que aconteça mais”, completou. O evento terminou com as considerações que a inovação vai muito além da tecnologia: ela acontece quando agentes se dispõem a dialogar, colaborar e criar novas formas de aprendizado, seja com um giz ou um tablet.