Criado em 2007, o fundo de manutenção e desenvolvimento para a educação básica representa uma grande conquista, mas encerra sua vigência em 2020. Novos caminhos são discutidos para que não seja extinto
Uma grande poupança coletiva – da ordem do bilhão – cujo destino garantido por lei é o investimento na educação básica pública nas redes estaduais e municipais do Brasil. Esse é o Fundeb, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento para a Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação.
O montante, que para este ano deve chegar a R$ 156 bilhões, é utilizado de acordo com algumas regras específicas (veja tabela abaixo) e deve contribuir para aumentar a qualidade e a equidade da educação em todas as modalidades de ensino, de creches e pré-escolas à Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Criado em 2007, numa ampliação do Fundef, que tratava apenas do Ensino Fundamental, o Fundeb é um marco na educação, uma vez que contribui para diminuir as desigualdades de recursos entre as redes de ensino de modo a assegurar que cada região tenha um investimento mínimo garantido.
Municípios e estados que arrecadam menos impostos per capita, e/ou têm muitos alunos matriculados na rede pública, ganham mais dinheiro para investir na educação básica. Nos últimos anos, nove Estados foram beneficiados pelos recursos federais: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí.
Dessa forma, estados e municípios têm segurança financeira para expandir o número de matrículas e cumprir responsabilidades educacionais. Os Municípios concentram esforços na Educação Infantil e nos anos inicias do Ensino Fundamental; já os Estados, nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio.
O Fundeb não é o único mecanismo de financiamento da educação básica, mas está entre os sete temas importantes para a educação de 2019 a 2022 do Educação Já, movimento encabeçado pelo Todos pela Educação.
O quesito Financiamento também sugere ações como revisão da distribuição de recursos federais relacionados à alimentação escolar e transporte, aumento da organização e transparência de gastos educacionais, aumento do investimento por aluno na educação básica e incentivo da distribuição de tributos para melhorar a política de aprendizagem.
Fundo coletivo
O cofre do Fundeb é abastecido por um conjunto de 27 fundos (correspondentes aos Estados Brasileiros mais o Distrito Federal). Cada um, por sua vez, é formado por parte dos recursos arrecadados via impostos, como o ICMS (Imposto sobre Circulação de Bens e Mercadorias). Além disso, o Governo Federal complementa com mais 10% do valor total dos fundos estaduais.
“A complementação da União representou um avanço na legislação, uma vez que deu credibilidade ao compromisso do Governo Federal de se responsabilizar por uma porcentagem do valor do fundo, ainda que pequena”, defende Andressa Pellanda, coordenadora executiva da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Por ser vinculado à arrecadação tributária, o montante do fundo que financia a educação básica sofre influência de variações da economia.
Estudo do Todos pela Educação revela que o fundo coletivo corresponde a pelo menos 50% do valor anual gasto por estudante em 4.810 municípios, sendo a maioria da região Nordeste. Em mais de 1.000 desses, a participação do Fundeb chega a 80%.
Mais alunos, mais dinheiro
Uma série de critérios coordena o repasse de recursos, entre elas as exigências de financiamento de cada modalidade de ensino (creche em tempo integral, por exemplo) e, principalmente, um valor mínimo estabelecido por aluno, chamado de Valor Aluno/Ano (VAA).
“O dinheiro vai aonde o aluno está”, explica Mariza Abreu, consultora na área de educação do Todos pela Educação e da Confederação Nacional dos Municípios.
Com variação a cada ano, de acordo com as flutuações da economia, o VAA em 2018 foi de R$ 3.016,67. Ou seja, esse foi o menor valor por estudante distribuído pelo Fundeb (por meio da complementação dos 10% da União) para Estados e Municípios. A previsão deste ano é um aumento para R$ 3.238,52.
Olhando somente para o VAA fica fácil perceber a discrepância dos investimentos se não existisse o Fundeb, como descreve a consultora Mariza: “Em 2015, o Valor Aluno/Ano no Maranhão, sem a complementação da União, teria sido de R$ 1.900. Com o aporte, foi para R$ 3.200. Já em São Paulo, que não recebe complementação, o Valor Aluno/Ano foi de R$ 6.000”.
Como apontou o Nexo, o Brasil gasta o mesmo volume de recursos, em termos de percentual do PIB, do que países como Áustria, França, Suécia e Reino Unido. Mas ainda está muito atrás no investimento da educação per capita, uma vez que temos uma população de 48,4 milhões de estudantes, . Além disso, por aqui o investimento na universalização da educação é recente: começou apenas nos anos 90.
“O valor estabelecido por aluno hoje está muito aquém do necessário para garantirmos um padrão mínimo de qualidade do ensino. Investimos de 3 a 5 vezes menos que o necessário”, aponta Andressa Pellanda. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação propõe outra forma de calcular o valor mínimo ideal.
Caminhos possíveis para a mudança
Na época de sua criação, o Fundeb foi vinculado à Constituição Federal de forma transitória, com período de vigência de 14 anos. Ou seja, tem data para acabar e ela está se aproximando: 31 de dezembro de 2020.
“Felizmente, o entendimento geral é de que é preciso dar continuidade ao Fundeb, tornando-o permanente na Constituição, mas existem muitas discussões sobre deixá-lo como está ou torná-lo mais distributivo de forma a melhorar a equidade da educação brasileira”, aponta Mariza Abreu.
São três as posições mais significativas no debate que se estabelece hoje. Todas partem de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), mas se diferenciam, principalmente, em relação ao peso de 10% da complementação da União:
– PEC 15/2015, com tramitação na Câmara dos Deputados e que propõe um aumento para 30% da complementação da União;
– PEC 65/2019, apresentada no Senado e que propõe que a contribuição aumente para 40%;
– Debate promovido pelo Todos pela Educação propõe uma contribuição entre 15% e 20%, dada a grave situação econômica que vivemos, e foca na indicação das fontes de onde sairá o dinheiro via arrecadação federal.
“Para o novo fundo funcionar ele precisará de uma lei de regulamentação, então o ideal é que a Proposta de Emenda Constitucional seja aprovada até dezembro deste ano para que a lei seja discutida ao longo de 2020”, alerta Mariza.
Fique ligado e acompanhe nossa série de reportagens sobre o Educação Já. Alfabetização foi o primeiro tema abordado.