Com aumento da presença da terceira idade na internet, ganham relevância projetos que ensinam como navegar nas redes para uma maior independência dessa população no universo digital

Entre aplicativos de redes sociais, deliveries e serviços, a terceira idade está cada vez mais presente na internet, principalmente, com o uso dos smartphones. Segundo a última estatística da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, o Pnad, realizada em 2019 e divulgada em abril desde ano, 45% dos idosos (pessoas com mais de 60 anos) acessam frequentemente a internet, sendo que este grupo teve maior crescimento, com aumento de 6,3% entre 2018 e 2019. O crescimento, segundo indicam as pesquisas anteriores, é constante e o índice pode intensificar quando se fala no período de pandemia, em que mais pessoas ficam conectadas.
A inserção dos vovôs e vovós na tecnologia pode ser desafiadora, mas há muitas pessoas dispostas a ensiná-los como fazer de forma segura e independente. Desde 2015, o Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC), da USP, em São Carlos, organiza o curso gratuito Práticas com Tablets e Celulares, voltado para pessoas com mais de 60 anos, realizado duas vezes por ano.
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(Imagens feitas antes da pandemia)
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(Imagens feitas antes da pandemia)
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(Imagens feitas antes da pandemia)

(Imagens feitas antes da pandemia)
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(Imagens feitas antes da pandemia)
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Os tutores são alunos da universidade, que se voluntariam e recebem um treinamento. Cada um ajuda de três a quatro alunos e, quem quiser, pode também se candidatar para ministrar as aulas também.
“São exibidos slides, com práticas de cada funcionalidade ensinada e cada uma delas com um aplicativo. Atualizamos os conteúdos todos os semestres, produzimos vídeos e eles recebem tarefas de casa por meio do aplicativo móvel, desenvolvido pelo laboratório Intermídia do instituto”, diz Kamila Rios Rodrigues, professora e pesquisadora da universidade, que participa do projeto desde 2016.
Kamila considera o projeto como uma das principais fontes de pesquisa para a universidade onde atua. “É muito gratificante para todo o time quando eles conquistam a independência e conseguem usar os aplicativos sem a ajuda de pessoas. É um orgulho muito grande dizer que o aprendizado chega a 90% dos alunos matriculados”, relata.
Aulas em casa: um novo desafio
Com a suspensão das atividades presenciais por causa do coronavírus, as aulas passaram a ser ministradas via GoogleMeet. “No presencial, estamos ao lado e a ajuda é mais fácil. No remoto, precisamos tentar adivinhar o que está acontecendo na tela. Além da dificuldade inicial de aprender a ferramenta de videoconferência”, diz. Uma das saídas, para a turma de iniciantes, foi convocar um ajudante em casa, normalmente um parente, para acompanhá-lo. “Nessa primeira fase, o aluno aprende algumas configurações básicas dos celulares e aplicativos mais usados, como YouTube, Facebook e Whatsapp. “Tem uma aula sobre segurança e compartilhamento. Eles aprendem a identificar mensagens falsas, aprendem a não repassar correntes e outros conteúdos”, conta. Já para os avançados entram serviços como Uber, iFood, Instagram e outros aplicativos que eles tenham interesse.
“Os maiores desafios estão relacionados à nomenclatura digital e formas de interação, que para eles não são intuitivas”, afirma Kamila. Segundo ela, o grupo costuma buscar independência na hora de usar as tecnologias. “Agora, com a pandemia, isso é mais urgente ainda. Eles precisam se comunicar com familiares e amigos e tiveram que aprender quase que de um dia para outro a usar as tecnologias. Nós do curso somos treinados para isso.”
A próxima turma será em agosto e as inscrições, que acabam rápido, ainda não estão abertas. Elas serão anunciadas no site da instituição. “Os idosos são muito disciplinados e interessados. Pouco faltam às aulas, estão sempre tirando dúvidas, é uma troca de conhecimentos e de muito respeito entre tutores e alunos”
Encontros virtuais
No ano passado, no início da pandemia, a Fundação Telefônica Vivo, por meio de seu Comitê de Voluntario, organizou rodadas de conversas virtuais com idosos na Casa Irmã Alice e na entidade Nova 4E, dedicada às pessoas com deficiência intelectual, para levar companhia ainda que à distância para os moradores dos espaços, que estavam isolados. Os encontros deviam ter cerca de trinta minutos, mas chegavam a ter mais de uma hora, como lembrou o gerente de marketing Carlos Alberto Amaral, embaixador do Comitê de Voluntariado de São Paulo. “Eu não tinha noção do quanto eu poderia ajudar fazendo tão pouquinho, sabe? E posso fazer mais. Acho que todo mundo pode”, disse na época.
Assista:
Passo a passo do “zap”
Grete Waldow, de 86 anos, mora em Santa Rosa, no Rio Grande do Sul, a quase 400 quilômetros de distância das suas netas, que vivem em Lajeado, no mesmo estado. Em 2015, uma delas a presenteou com um smartphone, para que pudessem conversar de forma mais prática. “Ela ficou animada porque não precisava mais se preocupar com o telefone fixo e as ligações de longa distância”, conta Bárbara Corrêa, de 28 anos, uma das netas. “Fizemos o básico, como todo neto, e ensinamos como mexer no aparelho”, diz.
“Nossa vó, ou melhor nossa oma, como a família se refere à ela por causa da origem alemã, nunca teve medo da tecnologia e fazia constantemente anotações em seu caderno, companhia analógica inseparável”, conta. Segundo Bárbara, ela registra tudo, desde sempre: tem sua visão sobre a II Guerra Mundial, a morte de Getúlio Vargas, Ditadura Militar, até quando andou pela primeira vez de avião.
A ideia de Bárbara, o projeto Vomo que Vomo, veio mesmo no final de 2019, durante uma conversa com a oma em um almoço de família: levar um pouco do olhar positivo da avó para outros idosos, usando a metodologia das anotações analógicas da oma, e mostrar como usar os celulares de forma segura e independente. “Ela sempre enxergou o lado bom da vida e emendava com um ‘vomo que vomo’, no sotaque dela, que é ‘vamos que vamos’, um movimento para frente.”
O objetivo inicial era que as aulas particulares oferecidas para as amigas e conhecidos pagassem o tratamento dentário da oma e que conseguissem angariar mais fundos para levar o mesmo projeto para dentro dos abrigos e casas de repouso para idosos que não têm condições de ter as aulas. “É um valor simbólico para a compra do material e para conseguir mais smartphones e levar a quem precisa”, explica.
Com o coronavírus e o isolamento social sendo necessário, o exercício foi de organizar o projeto de um jeito diferente, já que as visitas às casas dos alunos e às casas de repouso estavam suspensas. “O jeito foi montar o nosso site ‘Vomo que Vomo’ e disponibilizar gratuitamente um e-book, que a gente montou”, afirma.
A publicação oferecida no site para download é um passo a passo para os netos imprimirem e ensinarem seus avós a manusearem o aplicativo de mensagens Whatsapp. “Distribuímos a brochura também pelas redondezas e ainda vou disponibilizar os e-books de outros aplicativos, que estão em produção”, diz.
Bárbara, aos poucos, volta com as aulas presenciais, seguindo as regras de segurança. Além disso, ela publica conteúdos com a oma ou inspirados nela nas redes sociais, para incentivar que pessoas da turma da terceira idade engajem na tecnologia. Para ela, a inserção da faixa etária na tecnologia digital se faz ainda mais importante durante a pandemia, com o isolamento social. “Nós temos visto cada vez mais dos vovôs e vovós usando a internet, as redes sociais, isso é ótimo. Eles precisam fazer isso sem medo e com segurança”, conclui.
Navegando com segurança
Nas postagens do Instagram, Bárbara dá dicas de segurança para orientar os mais velhos ao navegar pelos aplicativos.
- Mensagem Estranha no Whats ou SMS: se for em nome de um filho ou neto, oriente seus familiares a ligarem para a pessoa ou um parente próximo e questionar sobre o conteúdo. A ligação deve ser realizada fora do WhatsApp, ou seja, discando o número, garantindo que ela não seja feita para o número golpista.
- Dados Pessoais: oriente seus pais e avós a nunca compartilharem dados pessoais, seja por WhatsApp, Facebook ou ligação. Quando for necessário cadastrar um cartão de crédito ou outro documento oficial, por exemplo, priorize a ajuda de alguém que domina o assunto e pode orientar no preenchimento correto dos dados necessários.
- Instalação de Aplicativos: muitos golpistas acessam dados ou distribuem vírus nos celulares por meio de aplicativos. Por isso, o ideal é não baixar o aplicativo por meio de links não-oficiais. Opte sempre por baixar apps na loja oficial do aparelho de celular. Onde elas estão? Se for no sistema Android (Google Play), já no sistema iOS (App Store).
- Ligações Insistentes: desconfie de ligações que prometem prêmios, solicitam diferentes dados pessoais e oferecem ofertas absurdas. Se ficou interessado pela ligação, anote em um papel o que o serviço te oferece e peça para retornar em outro momento, assim todos ganham tempo para conversar com os filhos e familiares, tirando dúvidas sobre a veracidade das promessas.