As gerações chamadas de nativas digitais nasceram cercadas por tecnologia e são exaltadas por apresentarem habilidades natas. Mas quais são os seus reais conhecimentos?
Não é novidade que muitas marcas criam seus posicionamentos e as estratégias de vendas dos seus produtos a partir dos hábitos, dos interesses e das decisões de compra dos clientes. Os millennials – pessoas nascidas a partir da década de 1980 – por exemplo, mudaram a forma de consumir. Devido às mídias sociais, os consumidores têm sido a principal fonte de informação para produtos e serviços. Paralelamente, as instituições de ensino e os profissionais de educação também estão se adequando às tecnologias e às demandas dos chamados nativos digitais.
Mas afinal, quem são os jovens conhecidos como nativos digitais e quais as suas características?
Quem são os nativos digitais
A expressão “nativo digital” foi criada em 2001 por Marc Prensky, escritor e palestrante estadunidense e especialista em educação. Ele usou o termo para se referir aos nascidos entre meados dos anos 1990 até 2010, com a vantagem de crescerem imersos na cultura digital.
Não se trata apenas de uma geração. Mas de todos os que cresceram no mundo já com tecnologia e que, desde sempre, aproveitam as facilidades proporcionadas pelos celulares, acesso à internet e compartilhamento de arquivos. E com isso, desenvolveram a capacidade de realizar múltiplas tarefas e utilizar ferramentas tecnológicas intuitivamente.
O conceito foi criado por Prensky para debater métodos de educação em sala de aula. Segundo o pesquisador, os métodos utilizados por professores até meados dos anos 1980 não surtiam o mesmo efeito em crianças que tinham videogames, computadores e outros dispositivos interativos.
A superexposição tecnológica causou algumas mudanças comportamentais e no dia a dia que afetam diretamente a educação, os objetivos profissionais e os planos de vida desses jovens.
Desmistificando as habilidades natas
É costume atribuir a esse grupo de jovens uma série de características. Algumas delas são a facilidade em lidar com várias tarefas ao mesmo tempo, a habilidade de encontrar a informação que procuram no meio de um montante, o perfil mais colaborativo, a maior consciência social, dentre outras.
Entretanto, essas capacidades típicas dos nativos digitais são o centro de muitas discussões. Afinal, a familiarização que eles têm com as novas tecnologias e a facilidade de manuseá-las não é sinônimo do pleno domínio de suas funcionalidades.
Esse debate acontece desde 2011 e, desde então, nenhum estudo aponta evidências de que existem diferenças na absorção de conhecimento pelas últimas gerações. E nem que a grande exposição às ferramentas digitais façam as gerações lidarem com as informações de forma diferente.
O consultor em Tecnologia Educacional, professor e facilitador do programa Educamídia, Marcio Gonçalves, acredita que o desenvolvimento precoce dessas habilidades entre os nativos digitais está diretamente ligado à superexposição às tecnologias digitais estimulada pelos próprios pais.
“As gerações que nascem imersas no uso de recursos tecnológicos acabam assimilando dos próprios pais o convívio com as mídias digitais. Ainda na barriga da mãe, o bebê, em muitos casos, já é exposto em redes sociais. Quando nasce, acompanha o ritmo da exposição por meio de fotos, uso de celulares etc. Cabe aos responsáveis mostrar a diversidade de mídias às crianças, pois o analógico e o digital agora convivem entre si”, detalha.
Dados apresentados pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) com base no relatório Leitores do Século 21 sugerem que grande parte dos nativos digitais têm dificuldades de interpretação de textos on-line, de discernir fatos de opiniões e encontrar fontes de informação confiáveis, o que os torna presas fáceis no ambiente de desinformação em que a internet tem se transformados nos últimos anos.
Para a análise, foram consideradas as habilidades de interpretação de texto de alunos de 15 anos avaliados no Pisa, o exame internacional aplicado pela OCDE em 2018 em estudantes de 79 países, inclusive o Brasil.
O documento também aponta:
Fonte: Relatório Leitores do Século 21
A importância da tecnologia e das competências digitais
Duas das dez competências a serem desenvolvidas por estudantes do Ensino Básico são tecnológicas, segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). São elas: utilizar linguagens diferentes (verbal, corporal, visual, sonora e digital); e compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética.
Para que essas habilidades sejam plenas, é fundamental que a familiaridade e a facilidade que os nativos digitais têm para utilizar a tecnologia sejam combinadas à aprendizagem off-line, por meio da leitura de livros, por exemplo. Ou a atenção ao que os professores ensinam em sala de aula, quando acontece de forma presencial. Por isso, é preciso que os estudantes adquiram esse conjunto de competências para terem total domínio das ferramentas e das informações que consomem.
Sobre essa questão, o consultor em Tecnologia Educacional pontua que os usos que fazemos das mídias digitais impactam na forma de ensinar e aprender.
“É por isso que a educação precisa reconhecer que podemos aprender além dos espaços tradicionais de ensino. Se estamos mais conectados, temos a oportunidade de aprender com mais pessoas”.
Ele também acrescenta que nos dias de hoje é fundamental ter conhecimento em cultura digital para saber conviver com as diversas mídias. “O pensamento crítico é uma competência necessária para entender a dinâmica das redes sociais. Saber interpretar a informação é uma habilidade que qualquer cidadão deve ter”.
Desenvolvimento excludente
Segundo informações do artigo Digital Natives will get old, too, publicado pelo site americano POLITICO?, as tecnologias criadas não são pensadas para integrar ou atender às expectativas das gerações mais velhas. Ainda que o envelhecimento populacional seja uma realidade para os próximos anos, devido ao aumento da expectativa de vida, e esse público represente um mercado consumidor em potencial.
O envelhecimento torna desafiadora a utilização das ferramentas digitais, uma vez que os avanços constantes da tecnologia exigem certa familiaridade e capacidade de rápida adaptação. Por esse motivo, é fundamental que sejam adotadas iniciativas inclusivas para tornarem as tecnologias mais amigáveis às pessoas das gerações passadas.
As diferentes gerações de nativos digitais – sejam eles os millennials ou os jovens da geração Z – possuem maneiras distintas de lidar com a tecnologia. Porém, muitos dos problemas enfrentados pelos mais velhos, atualmente, poderão ser os mesmos que os jovens de hoje irão enfrentar no futuro.