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Com ativismo da comunidade, bairro periférico se torna polo de arte e cultura na cidade de São Paulo

O arte-educador e gestor José Soró está olhando para o portão da sede da Comunidade Cultural Quilombaque em Perus, que tem instrumentos de sopro e um tambor desenhados.

Para chegar ao bairro de Perus, na zona norte de São Paulo, é preciso percorrer alguns quilômetros pela rodovia Anhanguera. Mais de 30 km separam seus 180 mil habitantes do centro e a região está entre as 15 com os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) da capital, com lugares que ainda lutam por água encanada e saneamento básico.

Ao mesmo tempo, vem se transformando num polo potente com diversos coletivos, festivais, eventos e espaços que buscam ressignificar o território periférico. O ponto de partida foi 2005, com a criação da Comunidade Cultural Quilombaque, formada por jovens artistas, liderados pelos irmãos Dedê, Clevinho e Fofão, com dois objetivos: combater o genocídio da juventude negra e lutar por aparelhamento cultural.

Exaltando arte e construção coletiva de conhecimento como ferramentas de transformação social, a comunidade cresceu e hoje agrega mais de 200 jovens envolvidos em intervenção urbana por meio de teatro, rap e hip hop, saraus, educação ambiental, grafite, maracatu, artes plásticas e até agroecologia e educação ambiental.

“Nós participamos de um momento interessante da cidade. As juventudes e os coletivos culturais resolveram pegar nas mãos a transformação de seus lugares. Se você for nas periferias de várias regiões, leste, sul, você vai ver isso. Nós somos parte desse tempo e soubemos compreendê-lo e atuar nele”, afirma José Soró, arte-educador e gestor do Quilombaque.

A potência da arte

Sem divisão formal de cargos, o Quilombaque conta com a gestão e consultoria de José Queiroz, o Soró, um mato-grossense de riso fácil que vive em Perus desde a infância. Quando topou com a iniciativa, em 2006, usou sua experiência de mais de 15 anos de trabalho com crianças e adolescentes em situação de rua por meio da arte e educação para profissionalizar a atuação do grupo.

No início, uma pesquisa informal mostrou que apenas um par de pessoas conseguia viver de arte. “Hoje já temos entre 20 e 30 pessoas que se sustentam assim”, explica, orgulhoso. Para ele, o aumento expressivo tem a ver com a luta pela capacitação e profissionalização de artistas, tornando a arte e a cultura em alternativas contra a pobreza, o tráfico e os empregos informais. “A arte tem o poder de transformar pessoas, porque dá repertório. Ela é um meio de empoderamento e emancipação de um sistema cruel”, defende.

Os Quilombaques fizeram o movimento de levar a arte para perto das pessoas e trabalhar o senso de pertencimento, mapeando locais degradados e os ocupando com eventos de todos os tipos. “Quando você joga um pingo d’água em uma chapa quente, ela evapora. Mas se você jogar um balde a coisa fica diferente. Quanto mais você articular, juntar e formar uma rede, mais poder você tem”, diz Soró.

Apesar da potência que fervilha, os movimentos locais mantêm a cabeça erguida, as mãos ocupadas e os pés no chão, como avisa Soró: “Não temos a pressa salvacionista do mundo. Não vamos mudá-lo, mas podemos alimentar uma reverberação, fortalecer a estrutura. Isso transborda e cria um processo integral de transformação”.

Enumeramos a seguir cinco importantes iniciativas para mostrar como a criação de coletivos que promovem atividades culturais e artísticas está ajudando a transformar a região de Perus, em São Paulo: 

Comunidade Cultural Quilombaque

A sede está localizada na Travessa Cambaratiba, número 5, uma rua sem saída e com um grande paredão com grafites de mais de 100 artistas de Perus e outras periferias de São Paulo, o que fez com que muitas pessoas chamassem o local pelo nome simbólico de Beco da Cultura. Na página do Facebook do Quilombaque, é possível acompanhar os eventos organizados ao longo do ano.

O arte-educador José Soró atua na Comunidade Cultural Quilombaque, no bairro de Perus.

Ocupação Artística Canhoba

A praça da Rua Canhoba foi construída pela Prefeitura de São Paulo em 2010 para abrigar um ponto de leitura, mas a obra foi paralisada sem nunca ter cumprido sua função. Em 2016, o Grupo Pandora de Teatro, em conjunto com outros coletivos artísticos, transformou o local em um rico espaço de cultura, aberto a todos os públicos e com a maioria das atividades gratuitas.

Ocupação Casa Hip Hop Perus

Localizada na Rua Júlio Maciel, número 52, a ocupação tornou um antigo prédio abandonado da região em um verdadeiro polo da cultura Hip Hop. As atividades envolvem oficinas, shows, saraus, exposições, batalhas de breaking, entre outras atividades anunciadas pelas redes sociais.

Biblioteca Padre José Anchieta

Criada em 1968, por muito tempo ficou abandonada, condenando seu acervo ao pó. Recentemente, foi revitalizada, tem parte de seu acervo itinerante para facilitar o acesso da comunidade aos livros e funciona 7 dias por semana até às 22h.

Museu Territorial Tekoa Jopo’í

Com o Plano Diretor Estratégico da São Paulo – lei municipal de 2014 que orienta o desenvolvimento e o crescimento da cidade até 2030 – e a consequente criação dos Territórios de Interesse da Cultura e da Paisagem (TICP), moradores e ativistas locais desenharam um museu territorial de caminhos afetivos, turísticos e históricos.

Numa espécie de turismo de resistência, os pontos de visitação do Museu são interligados por 6 trilhas de aprendizagem: Trilha Ditadura Nunca Mais, que resgata a história da vala clandestina no Cemitério Dom Bosco; Trilha de Reapropriação e Ressignificação de Espaços Públicos; Trilha Perus Feira Graffiti; Trilha O Jaraguá é Guarani; Trilha Agroecologia Campo e Cidade MST; e Trilha Ferrovia Perus – Pirapora. Por enquanto, as visitações são feitas diretamente com a equipe do Quilombaque para grupos de Universidades e instituições.

Perus: bairro de São Paulo se transforma por meio da arte e cultura
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