Com as formas de aprender em constante transformação, a discussão sobre qual é o papel da escola feita por alunos, educadores e gestores, é fundamental para entender as demandas da sociedade para a educação do presente e do futuro.
O que esperar da escola do século XXI? Essa pergunta foi o tema da campanha Escolha Transformarquesurgiu em 2018,como uma mobilização de comunicação, e reuniu especialistas, representantes do terceiro setor, educadores, estudantes e gestores de diversas redes brasileiras.Com a orientação dos organizadores da campanha, as redes eram convidadas a gravar vídeos, divulgar em carta aberta o Projeto Político Pedagógico da escola, e compartilhar experiências.
“A escola é um equipamento público que chega a todos os lugares. Podemos questionar se chega com qualidade, mas ela está presente na vida dos jovens e suas famílias. Isso faz dela um equipamento público muito importante e potente para a sociedade como um todo. Discutir a transformação na escola não é sobre preparar os jovens para o futuro, é sobre prepará-los para o presente”, afirma Tatiana Klix, diretora do Porvir.
Para que todas as mudanças aconteçam em igual proporção, em todas as redes brasileiras, a especialista acredita que outros fatores que envolvem a educação são necessários. Além das contarem com o apoio de políticas públicas inclusivas, diretrizes claras para implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e investimento em formação de professores, é preciso escutar com atenção o que os educadores, pais e estudantes têm a dizer.
“A defesa de que essa mudança na escola é relevante, urgente e significativa parte do contexto da nossa sociedade atual, que pede outras competências e outro envolvimento com o processo de ensino-aprendizagem”, afirma Tatiana. “Envolver os jovens nessa construção de novos caminhos tem muito a contribuir para a transformação da escola, e também faz parte do desenvolvimento deles como cidadãos”, complementa.
Com a palavra, os jovens
“A escola é um espaço pra gente fazer amizade, se desenvolver, aprender a ter empatia e conhecer coisas novas”. É assim que Mickaelly Cézar Silva, uma estudante de 16 anos, descreve o papel da escola. A jovem vai além, afirmando que essa relação só funciona se todos os atores envolvidos nesse ambiente trabalharem juntos. “A escola é um conjunto. Sem professores, estudantes e diretores ela não anda pra frente”.
A visão da estudante Mickaelly condiz com o resultado que da pesquisa Nossa Escola em (Re) Construção, uma iniciativa do Porvir em parceria com a Rede Conhecimento Social, que ouviu cerca de 260 mil estudantes de todo o Brasil. Desse total de jovens, 93% faz parte da rede pública e estão na faixa etária entre 13 e 21 anos.
Os dados mais recentes da pesquisa, lançada em 2019, mostram que os estudantes reconhecem o papel fundamental da escola para o desenvolvimento de um futuro melhor, mas apontam questões que precisam ser revistas para que esse espaço continue a fazer sentido para a nova geração.
Cada vez mais os estudantes esperam uma escola mais tecnológica e preparada para ajudá-los a tomar decisões para o futuro. Por isso, os jovens entusiasmam-se com a possibilidade de flexibilizar os itinerários formativos, mas se preocupam com o grau de preparação que os conteúdos oferecerão para o mercado de trabalho e para a faculdade.
“As habilidades desse século são novidade tanto para os professores quanto pra gente. Eu achei muito interessante a inclusão das eletivas, do projeto de vida e das tecnologias na escola, porque isso vai nos preparar para o mercado do trabalho e para a vida”, diz Mickaelly. “Se a escola investir mais nesses materiais inovadores e em aulas interativas, com vídeos, fotos, debates, exposições, a chance dos alunos ficarem interessados é muito maior!”.
Os estudantes também chamam atenção para a questão da participação nas decisões. Segundo a pesquisa, 95% das escolas contam com coletivos, conselhos e grêmios estudantis, mas 45% dos jovens afirmam não ter participação na tomada de decisões na escola. “Sinto falta de mais projetos que envolvam a participação do aluno. É importante que a gente saiba que fazemos parte desse ambiente, e por isso temos direito de falar sobre nosso desenvolvimento”, afirma um dos entrevistados pelo estudo.
A visão do espaço escolar como um ambiente de desenvolvimento de habilidades socioemocionais também é compartilhado pelos estudantes. 64% dos jovens ouvidos pela pesquisa Nossa Escola dizem sentir falta de um psicólogo para orientá-los no que diz respeito às relações que constroem. Outra característica destacada pelos estudantes foi o desejo de maior aproveitamento dos ambientes externos, fora da sala de aula.
Caminhos para a (re)construção
Criada em 2016, a pesquisa Nossa Escola em (Re) Construção, surgiu com o intuito de trazer os jovens brasileiros para o debate sobre as expectativas em relação à escola. O engajamento surpreendeu tanto que a iniciativa se tornou permanente, com a construção de uma plataforma que deixa o questionário fixo para que mais estudantes possam opinar sobre suas escolas. Além disso, os educadores e gestores podem se cadastrar na plataforma Nossa Escola e ter acesso às respostas de seu grupo de estudantes a partir de relatórios.
O que faz falta em uma escola?
Os jovens pedem uma escola mais dinâmica e flexível. Os educadores pedem uma gestão mais democrática. A gestão pede políticas educacionais mais efetivas, que possibilitem recursos para oferecer uma educação de qualidade nas redes.
“O ambiente da escola tem que ter uma infraestrutura que estimule o aluno e tenha espaços organizados para a aprendizagem”, opina a pedagoga Laís Fernandes Soller, que também é diretora de uma escola da rede pública de Campinas.
Para Laís, à medida que os estudantes e os educadores percebem que todos os espaços da escola estão organizados, passam a criar suas próprias rotinas de trabalho e aprendizado baseadas nessa estrutura. A educadora ainda ressalta, que as demandas não são poucas, mas muita coisa pode ser feita a partir da escuta.
“A escola é o ambiente de formação da sociedade. Ao ouvir os pais, os estudantes e os educadores a gente vai entendendo as questões que toda a comunidade traz. Aqui aprendemos conteúdo, mas também a resolver problemas, lidar com as emoções, construir um espaço coletivo para cidadania. Somos o elo dessa mudança social”, conclui.