Entenda como os serviços de streaming e a Ciência de Dados trabalham juntos para personalizar a experiência do usuário e criar sistemas de recomendação
Quem está assistindo? Não é à toa que essa pergunta aparece na tela inicial da Netflix. Afinal, conhecer seus usuários permitiu à pioneira dos serviços de streaming revolucionar a indústria do entretenimento a partir da Ciência de Dados.
A plataforma contava, no final de 2021, com 213.5 milhões de assinantes no mundo. Além disso, ela utiliza o grande volume de dados gerados pelos assinantes para treinar os algoritmos. Dessa maneira, a Netflix consegue recomendar um próximo filme para você assistir com 80% de precisão.
“Os sistemas de recomendação sempre comparam o seu comportamento com o de outros usuários. A partir do que você já consumiu, a plataforma aprende com seus padrões e faz comparações com perfis semelhantes ao seu”, explica Carla Vieira, engenheira de software reconhecida pelo Google em Machine Learning.
Assim também funciona o Spotify, o serviço de streaming de música mais popular e mais usado no mundo. Ele cruza informações sobre as preferências musicais para criar categorias divididas em partes. Conforme o número de acessos aumenta, o algoritmo aprende mais sobre como entregar uma experiência musical personalizada ao usuário.
Entretanto, no caso do streaming de música, essa estratégia resulta em uma taxa de 42% de mudança de usuários não pagos para a versão premium. A versão paga possibilita uma experiência ainda melhor a quem utiliza o serviço.
“Isso acontece porque todo tipo de comportamento pode virar uma métrica relevante, tanto para as plataformas quanto para os anunciantes”, complementa Carla.
Leia mais: 5 filmes para refletir sobre o uso de dados
Organizando a experiência do usuário
Quando a Netflix iniciou o serviço de streaming em 2007 não havia base de dados suficiente para criar uma experiência personalizada aos usuários. A princípio, a página inicial era a mesma para todos, com organização em ordem cronológica dos títulos de filmes e séries assistidos.
Uma vez que o volume de dados coletados foi aumentando, a área de experiência do usuário (UX) ganhou destaque. Especialmente no uso dos algoritmos para alterar o grau de imersão em relação ao visual da plataforma.
“Se você abrir a página de outro usuário, provavelmente ela será diferente da sua. Desde a capa dos filmes até a ordem em que eles aparecem”, analisa Carla Vieira. A especialista também é mestranda em Inteligência Artificial pela Universidade de São Paulo (USP).
De acordo com a especialista, essa decisão é tomada a partir de testes de conversão. Dessa maneira, os cientistas de dados dividem os usuários em grupos e alteram a experiência entre eles para saber qual delas resultará em mais engajamento.
“Além da identidade visual, o layout dos serviços de streaming precisa levar em conta as preferências, o idioma e o contexto geográfico dos usuários. Inclusive, essa lógica também é válida para redes sociais como Instagram, Facebook e Twitter”, acrescenta.
Streaming e Ciência de Dados: impacto na indústria cultural
Nesse meio tempo, os serviços de streaming passaram de distribuidores de conteúdo a produtores originais de filmes e séries. Só para ilustrar, em 2020, a Netflix recebeu 24 indicações ao Oscar por suas obras, abrindo as portas do segmento para as demais plataformas.
Desde então, a empresa conquistou participação vitalícia na maior premiação de Hollywood. Mas qual é o papel da Ciência de Dados nessa trajetória?
“Da mesma forma que os hábitos de consumo influenciam os sistemas de recomendação, a indústria cultural é influenciada pelas preferências dos usuários. Essa relação acaba por interferir nas escolhas temáticas dos produtores culturais”, responde Carla.
Sem dúvida, a tecnologia ajuda a melhorar os processos de decisão e resolução de problemas. Por outro lado, as ferramentas criadas pela inteligência artificial também impactam a dinâmica social.
Por exemplo, os algoritmos de recomendação criam “bolhas” que impedem os usuários de acessar conteúdos que não foram categorizados em determinado perfil.
“Isso pode enviesar culturalmente e politicamente a opinião pública e os pensamentos produzidos pela sociedade”, analisa a pesquisadora.
Nesse sentido, Carla Vieira aponta caminhos para furar a “bolha” criada pelos algoritmos enviesados. Todos eles encontram no letramento digital o ponto de partida para o uso consciente e responsável de tecnologias.
“Compreender como funcionam os algoritmos e como eles impactam nossas escolhas é fundamental para pensar criticamente sobre nossos direitos e deveres no ambiente virtual”, aponta.
3 conteúdos para refletir sobre o impacto dos algoritmos
Documentário | Dilema das Redes → Neste documentário da Netflix, especialistas em tecnologia e desenvolvedores do Vale do Silício analisam o impacto das redes sociais na democracia e nas relações sociais. Classificação indicativa: 12 anos.
Livro | Algoritmos de Destruição em Massa → Escrito pela cientista de dados estadunidense Catherine O’Neil, o livro se dedica a analisar os modelos de algoritmos utilizados pelas grandes empresas de tecnologia. O objetivo da obra é refletir sobre a discriminação que ainda se reflete no uso dos sistemas matemáticos por trás da inteligência artificial.
Livro | Algoritmos da Opressão → O livro da autora Safiya Noble se dedica a analisar os mecanismos de busca do Google sob a perspectiva da discriminação racial entre mulheres negras e brancas. O estudo é recomendado para estudantes a partir dos anos finais do Ensino Fundamental e foi recém-traduzido para o português.
Você já parou para pensar em como as plataformas de streaming sempre sugerem os filmes, séries e músicas alinhadas ao seu gosto? Não é por acaso que isso acontece. Todas as indicações são feitas por causa da Ciência de Dados!