Educar para Transformar é um cursinho gratuito para pessoas trans. Desenvolvido para estimular a diversidade e inclusão, o curso é aberto a todas as idades.
Experiência que começou no segundo semestre de 2017 quer aumentar a diversidade dentro de espaços educativos
A escola é um dos muitos lugares de vulnerabilidade e violência para as populações transgêneras no Brasil. Segundo estudos conduzidos pelo presidente da Comissão da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), João Paulo Carvalho Dias, o país concentra 82% da evasão escolar de travestis e transexuais.
Vítimas de intolerância dentro da escola e muitas vezes na própria família, é difícil para os adolescentes transgêneros concluírem o ensino médio, quiçá estudar em uma universidade. Os números da violência se refletem na vida adulta – o país é também o que mais mata pessoas transgêneras no mundo, segundo a ONG Transgender Europe.
Notícias como as da educadora Adriana Salles, segunda travesti no país a dissertar seu mestrado em Mato Grosso, ou da historiadora Andrea Lais Cantelli, que fundou o Instituto Brasileiro Trans de Educação (IBTE) para criar estratégias contra bullying escolar, ainda são pontos fora da curva das estatísticas.
E é na tentativa de mudar esta realidade e ocupar os espaços educativos e universitários com cada vez mais diversidade e respeito, que o coletivo recifense RUA se uniu em 2017 para criar Educar é Transformar, um cursinho gratuito para pessoas trans.
Já atuando em pautas como militância negra, LGBT e direitos das mulheres em Pernambuco, o grupo de estudantes sentiu a necessidade de oferecer um curso pré-vestibular gratuito para população trans. As aulas acontecem aos sábados em espaço cedido pelo DEMEC – Faculdade de Direito do Recife.
“Mais do que dar chances tanto de prestar o ENEM quanto de fazer o Encceja – exame de equivalência do ensino médio – queríamos criar um espaço plural de fortalecimento, onde pessoas trans pudessem ter acesso a educação gratuita e de qualidade, como qualquer pessoa”, explica Evandro Farias, um dos responsáveis pela estruturação do cursinho.
Educar é Transformar
Evandro diz ter ficado surpreso quando fez uma chamada pública para educadores voluntários e recebeu 90 inscrições das mais variadas áreas. O número de alunos também excedeu expectativas, com 60 interessados – e não somente transgêneros, mas também estudantes de baixa renda, que enxergaram no curso uma oportunidade de passar no vestibular. Assim, as aulas foram divididas semanalmente entre linguagem e matemática, e ciências humanas e natureza.
“Os que permaneceram até a época do ENEM foram todas alunas e alunos muito dedicados, dispostos a aprender. Mais do que necessariamente passar no vestibular, desenvolveram um espaço de amizade, onde podiam trocar suas experiências e se fortalecer”, diz Evandro. O educador conta que também o alegra o fato de que estudantes estejam interessados em movimentos sociais, ajudando a propagar a experiência que viveram durante o semestre.
“Não só em Recife, mas como em vários estados do Brasil, existem muitos cursinhos de vestibular pago. Quem tem condições, consegue ingressar a universidade, quem não tem, dificilmente consegue. Não toleramos preconceitos e queremos criar salas de aulas mais democráticas e diversas”, diz Evandro. As expectativas são de reformular o cursinho para 2018, ampliando o número de alunos e alunas.
Enquanto os resultados do ENEM de 2017 não chegam para os mais de 40 estudantes do Educar é Transformar, Evandro ressalta a importância do projeto. “Não sabemos ainda quem ingressou na faculdade, mas tivemos desenvolvimento social, fizemos pessoas se unirem em prol de uma luta”, finaliza o educador.