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Confira a nota técnica da Fundação Telefônica Vivo sobre os resultados do Saeb/Ideb 2023 apresentados pelo Ministério da Educação e Inep

#Educação#EducaçãoBásica#Saeb

O Ministério da Educação (MEC) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) apresentaram nesta quarta-feira (14/08) os resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), referentes a 2023.

O Saeb, que ocorre a cada dois anos, tem como principal objetivo avaliar a qualidade da educação básica oferecida no país, em âmbito público e privado, e fornecer subsídios para a formulação, monitoramento e aprimoramento de políticas públicas educacionais.

Por meio de testes e questionários aplicados, o Saeb reflete os níveis de aprendizagem demonstrados pelo conjunto de estudantes do 5º e 9º ano do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio. Esses níveis estão descritos e organizados, de modo crescente, em escalas de proficiência (de 0 a 500) para Língua Portuguesa e Matemática.

Como pode ser observado na Figura 1 abaixo, as médias subiram com relação a 2021. Contudo, é importante ter cautela na interpretação desses avanços e evitar realizar afirmações categóricas sobre a evolução do desempenho. Isso porque a edição de 2021 ocorreu ainda durante o período da pandemia de COVID-19. Portanto, seus resultados foram diretamente impactados por fatores como o fechamento das escolas e o baixo e atípico percentual de estudantes que participaram da avaliação naquele momento1.

Infelizmente, neste primeiro momento de divulgação, não foram ainda disponibilizadas informações específicas sobre as taxas de participação dos estudantes no Saeb 2023, as quais devem ser publicadas nas próximas semanas pelo Inep. Dessa forma, seria ainda precoce tecer afirmações comparativas somente entre as edições de 2021 e 2023.

É importante observar que os resultados ficaram abaixo dos apresentados em 2019 (período pré-pandêmico) e da tendência dos anos anteriores, tendo em vista a evolução média da série histórica considerada (de 2013 a 2019). É fundamental reforçar que uma análise mais qualificada requer a avaliação dos microdados do Saeb, para averiguar se as taxas de participação das edições são completamente comparáveis.

Figura 1

Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb)

Os resultados de aprendizagem apurados pelo Saeb, juntamente com as taxas de aprovação aferidas no Censo Escolar, compõem o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

O Ideb oferece uma visão mais abrangente da qualidade da educação, uma vez que considera a progressão dos estudantes por meio do sistema educacional. Cumpre mencionar que o índice combina o desempenho dos alunos em Língua Portuguesa e Matemática e varia em uma escala de 0 a 10 (sendo 10 o melhor desempenho possível).

A Figura 2  abaixo mostra que houve um ligeiro crescimento do índice para os anos iniciais do Ensino Fundamental e o Ensino Médio em relação à última edição. Contudo, os valores também ficam abaixo da tendência histórica. Vale observar que, exceto para o caso dos anos iniciais do Fundamental, os resultados das demais etapas ficaram abaixo das metas estabelecidas para 2021.

Novamente, é importante interpretar os resultados do Ideb com cautela, pois. sendo composto por dois indicadores, um bom desempenho pode ser desproporcionalmente influenciado por apenas um deles. Por exemplo, o Ideb pode apresentar uma melhoria geral devido a um avanço em Matemática restrito a um pequeno grupo de alunos, mesmo que as taxas de aprovação globais tenham caído. Em 2021, os resultados do Ideb também foram significativamente afetados pela decisão de várias redes de ensino de autorizar a aprovação automática dos estudantes, visando manter o vínculo com as escolas e evitar o abandono escolar. Essa medida pode ter inflado as taxas de aprovação naquele momento o que, por sua vez, elevou os índices do Ideb. Assim, é fundamental aguardar a divulgação dos microdados, que serão ainda publicados pelo Inep, para aprofundar as análises sobre o comportamento do índice.

Figura 2

Vale mencionar também que, em 2019, a aplicação da prova do Saeb passou a ser censitária (e, portanto, passou a incluir grupos sociais mais heterogêneos). Por outro lado, houve melhora expressiva dos resultados de desempenho no Ensino Médio. É fundamental aprofundar as análises sobre os dados divulgados em 2023 a fim de entender se há uma retomada do comportamento anterior à pandemia e se, de fato, houve um salto importante na qualidade do Ensino Médio brasileiro em 2019 (ou se os resultados daquela edição podem ter representado algum ruído na série histórica do Saeb).

Ainda sobre essa etapa de ensino, é importante destacar que a avaliação de 2019 ocorreu em um contexto anterior à implementação do Novo Ensino Médio, instituído em 2017 pela Lei nº 13.415. Embora a reforma tenha estabelecido mudanças significativas, os resultados daquela edição do Saeb dificilmente refletem os impactos da nova estrutura curricular, pois as avaliações não foram revisadas para alinhar-se à Base Nacional Comum Curricular (BNCC). No entanto, os dados de 2023 podem oferecer alguns indícios iniciais sobre o processo de implementação, ainda que de maneira limitada.

 

Educação Profissional integrada ao Ensino Médio

A apresentação realizada pelo Inep em coletiva de imprensa hoje (14/08/2024) chamou a atenção para as disparidades regionais observadas. É importante destacar que, além dos dados tradicionais do Ideb, foram apresentadas informações consolidadas referentes ao Ensino Médio Integrado à Educação Profissional. Embora elas não sejam atualmente consideradas na contabilização do resultado do Ideb, seria importante incluí-las nas próximas edições do Ideb.

Quando contemplados, estes dados revelam uma melhora expressiva dos resultados de muitas redes estaduais. Segundo o ministro da Educação, Camilo Santana, “houve um esforço dos estados brasileiros em ampliar suas redes de ensino médio profissionalizante”, o que reflete uma política de incentivo do próprio governo federal. Por isso, é importante que os resultados finais do Ideb também contemplem esses números do ensino técnico, estando, assim, alinhados com o novo Plano Nacional de Educação (PNE), que está sendo discutido para o próximo decênio.

 

Desigualdades raciais no acesso à tecnologia e desdobramentos sobre ensino e aprendizagem de Matemática

Os resultados do Saeb refletem uma combinação de fatores, incluindo a qualidade do ensino, as condições socioeconômicas dos alunos e a formação dos professores. Embora seja necessário aprofundar as análises para identificar outros elementos que possam influenciar esses resultados e mensurar tais efeitos, alguns estudos já apontam para uma correlação significativa entre acesso à infraestrutura adequada, incluindo a disponibilidade de recursos tecnológicos, e o desempenho dos alunos.

Estudo recente2 realizado pelo Núcleo de Estudo Raciais do Insper (NERI), com o apoio da Fundação Telefônica Vivo, encontrou uma relação positiva entre a exposição à tecnologia, medida a partir do acesso à internet e do uso de recursos digitais (como computador, projetor e softwares de ensino) pelo professor em sala de aula, e o desempenho dos alunos em Matemática.

Os resultados mostram que um aumento de 10 pontos no índice de exposição à tecnologia no 5º ano do Ensino Fundamental está associado a uma nota até 18,5 pontos maior em Matemática no Saeb (escala de 0 a 500) de 2021. Correlações positivas e estatisticamente significativas também são encontradas para o 9º ano do Ensino Fundamental (até 10 pontos) e para o 3º ano do Ensino Médio (até 9 pontos).

A pesquisa evidencia, porém, que existem disparidades raciais relevantes no acesso e exposição dos alunos à tecnologia. Considerando alunos brancos e negros do 9º ano do Ensino Fundamental, por exemplo, a diferença no índice de exposição à tecnologia (em uma escala de 0 a 100) pode chegar a 6 pontos. Tais desigualdades podem impactar diretamente o desempenho dos estudantes, inclusive em Matemática.

Figura 3

É importante destacar que uma melhoria no cenário educacional não se resume à elevação das médias do Saeb.  É fundamental que os avanços da avaliação sejam acompanhados por redução das disparidades de desempenho.  Por isso, é crucial um acompanhamento continuado de indicadores e estatísticas raciais, e o aprofundamento das pesquisas que investiguem os fatores com maior potencial de impacto sobre desempenho em Matemática. Dessa forma, será possível aprimorar políticas públicas educacionais e assegurar que os avanços de aprendizado sejam distribuídos de maneira equitativa.

 

O uso qualificado da tecnologia como aliado à aprendizagem em Matemática

Embora a tecnologia seja uma ferramenta essencial e uma aliada valiosa no processo de ensino e aprendizagem, sua utilização isolada não é suficiente para impulsionar os resultados de aprendizagem que se refletem nas avaliações educacionais.

Os resultados do PISA 20223 (OCDE, 2023) mostram que variações no desempenho dos estudantes estão associados a como os dispositivos eletrônicos são inseridos na rotina dos alunos. O relatório da OCDE mostrou que os estudantes dos países-membros da organização que utilizavam equipamentos digitais por até 1 hora diária para atividades de aprendizagem tendiam a ter um score 25 pontos mais alto em Matemática do que estudantes que não utilizam tais equipamentos (OCDE, 2023, p. 193).

Tais evidências reforçam a importância do professor para direcionar o uso da tecnologia para fins pedagógicos e formar cidadãos com as competências digitais, tal como preconizado pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A simples exposição a recursos tecnológicos, por si só, não é capaz de desenvolver plenamente tais competências.  A figura do docente, munido de habilidades digitais, é fundamental para orientar a aplicação da tecnologia como aliada à aprendizagem.

Box 1

Um exemplo de uso da tecnologia para apoiar diretamente o ensino de Matemática com a orientação de professores pode ser encontrado no programa Matemática Profuturo4.

O programa disponibiliza uma plataforma digital de aprendizagem em matemática para os alunos de 6 a 12 anos, pautada pelo princípio do “aprender fazendo”, colocando-os assim em um papel ativo no processo de aprendizagem. Com uma ampla variedade de exercícios de Matemática, a ferramenta explora representações visuais e estimula o raciocínio lógico e crítico. Além disso, a plataforma incentiva a personalização do ensino através de um recurso digital inteligente, que apoia os professores na adaptação de lições e exercícios conforme o nível de compreensão de cada aluno.

Mais especificamente com relação à formação docente, vale reforçar que o ProFuturo parte do pressuposto que apenas professores com competências digitais podem orientar o desenvolvimento dessas mesmas habilidades em seus alunos, o modelo comtempla uma esfera de desenvolvimento profissional do professor, oferecendo treinamento, acompanhamento e apoio contínuo por meio de aprendizagem combinada (presencial e online), a fim de promover a integração da tecnologia na sala de aula.

A Matemática como impulsionadora do desenvolvimento tecnológico

É importante destacar também que, assim como a tecnologia e as competências digitais podem impactar o desempenho dos alunos em Matemática, a construção das habilidades analíticas e matemáticas dos jovens é também fundamental para o próprio desenvolvimento tecnológico do futuro. Tais competências são a base para carreiras nas áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM), cada vez mais demandadas devido às transformações do mundo digital: essas profissões em STEM não apenas oferecem maiores oportunidades de empregabilidade, mas também estão associadas a salários mais altos e melhores perspectivas de crescimento.

No entanto, estudantes que apresentam menor desempenho em Matemática frequentemente enfrentam sentimentos de ansiedade e insegurança em relação à disciplina. Essa apreensão pode desmotivá-los a seguir carreiras em STEM, limitando seu potencial de ingresso em áreas que são essenciais para o desenvolvimento socioeconômico.

Garantir que todos os alunos desenvolvam uma base sólida em Matemática é uma forma de assegurar que eles possam aproveitar as oportunidades oferecidas pelas carreiras STEM e contribuir ativamente para a evolução tecnológica e científica do país.

 

O papel das avaliações para o avanço da aprendizagem

A avaliação contínua e abrangente é outro pilar fundamental para sustentar avanços efetivos no desenvolvimento das competências dos estudantes. Embora a análise dos resultados do Saeb, a cada dois anos, seja crucial para entender o desempenho educacional em uma escala macro, a avaliação das competências dos estudantes não deve se limitar a esse exame.

Em uma recente apresentação no IV Seminário Internacional de Gestão Educacional, promovido pelo Instituto Unibanco, em junho deste ano, discutiu-se sobre a importância das avaliações internas nas escolas, que permitem uma resposta mais ágil para a implementação das melhorias necessárias nesses programas. Um dos palestrantes no evento, Jorge Lira, professor do departamento de Matemática da UFC (Universidade Federal do Ceará), enfatizou a necessidade de avaliações contínuas e coerentes, abrangendo desde o formativo até o somativo, com base em sólidos fundamentos conceituais. Isso asseguraria a consistência das avaliações e possibilitaria um acompanhamento contínuo do progresso dos alunos, permitindo que escolas e redes de ensino inovem e se adaptem rapidamente às necessidades educacionais.

O programa Matemática ProFuturo, apresentado no Box 1, é um exemplo de adaptação frente às novas demandas de uma era digital, evidenciando como o ensino e a aprendizagem de Matemática podem e devem caminhar juntos com o desenvolvimento de competências digitais. Portanto, tão importante quanto a avaliação de Matemática, é fundamental avaliar o progresso das competências digitais dos estudantes.

De fato, em outubro de 2022 foi divulgado o complemento da BNCC sobre Computação, que prevê diretrizes para a incorporação da educação digital na educação básica. Além do desafio de implementação desse complemento nos currículos das redes, existe também a necessidade de construção de uma avaliação dessas competências digitais dos alunos. É imperativo que exista um instrumento de referência que permita a mensuração do nível de apropriação tecnológico atual dos estudantes, o que possibilitará acompanhar o desenvolvimento dos jovens nessa área.

Os resultados do SAEB 2023 divulgados hoje, embora ainda precisem ser analisados em conjunto com outros dados que serão disponibilizados nos próximos dias, já evidenciam caminhos para direcionar as políticas educacionais no país, como o PNE, atualmente em análise pelo Congresso Nacional. Destaca-se a necessidade de estratégias de recomposição de aprendizagens, sobretudo na área da Matemática, que devem ser implementadas considerando práticas pedagógicas inovadoras, e que desenvolvam desde competências fundamentais até as mais complexas. E que permitam aos estudantes brasileiros atuarem em um mundo em constante transformação e cada vez mais digital.

1 Referência: Instituto Unibanco, “Nota Técnica: Saeb e Ideb 2023: recomendações para interpretar resultados”, 2023. Disponível em https://observatoriodeeducacao.institutounibanco.org.br/api/assets/observatorio/b094a67c-2ed8-42dc-a7ea-c2094ff0b29d/instituto-unibanco-notatecnica-ideb2023-final.pdf?version=0. Acesso em 11/08/2024.

2 Referência: estudo realizado pelo Núcleo de Estudos Raciais do Insper (NERI) com o apoio da Fundação Telefônica Vivo. Disponível em https://www.fundacaotelefonicavivo.org.br/acervo/tecnologia-e-desigualdades-raciais-no-brasil/

3 OCDE. (2023). PISA 2022 Results (Volume I): The State of Learning and Equity in Education, PISA, OECD Publishing, Paris. Acesso em 07 de 02 de 2024, disponível em <https://doi.org/10.1787/53f23881-en>.

4 Idealizado pelo ProFuturo e desenvolvido pela Fundação Telefônica Vivo e Fundação La Caixa, em parceria com as Secretarias de Educação de diferentes estados, Instituto de Estudos Avançados da USP-Ribeirão Preto e FADEB (Fundação de Apoio ao Desenvolvimento da Educação Básica no MS). Atualmente, o ProFuturo está presente em 3 estados e 22 municípios, atendendo a 546 escolas e 25 mil alunos.

5GEM Report – Technology on her terms (Relatório Global de Monitoramento da Educação – Tecnologia nos termos delas). Disponível em: < https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000389406>. Acesso em 13/08/2024.

Saeb 2023: Resultados divulgados de Matemática devem ser interpretados com cautela
Saeb 2023: Resultados divulgados de Matemática devem ser interpretados com cautela