O 4º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação debateu o retorno às aulas e as mudanças trazidas pela pandemia em diversos países. Confira os destaques!
Entre os dias 19 e 23 de outubro, aconteceu o 4º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação (Jeduca 2020). Organizado pela Associação de Jornalistas de Educação, o evento, totalmente online, teve como tema central “O jornalismo de educação na pandemia
– O que fizemos até aqui e como continuamos na retomada”.
Voltado principalmente para estudantes, jornalistas de educação e profissionais da comunicação, o congresso foi realizado, mais uma vez, com apoio da Fundação Telefônica Vivo. A programação contou com 12 mesas e abordou tanto temas relacionados à cobertura da mídia durante a pandemia quanto às mudanças na educação (Básica e Superior) com o ensino remoto, além dos desafios e oportunidades do cenário pós-pandemia.
Confira seis reflexões que se destacaram ao longo do Jeduca 2020:
Volta às aulas diferente em cada Estado
Estados e cidades brasileiras estão passando por momentos distintos no enfrentamento da pandemia, e isso impacta diretamente na decisão de voltar, ou não, às aulas presenciais.
Manaus (AM), a primeira cidade do país a reabrir escolas, em agosto, começou a reabertura pelas escolas estaduais de Ensino Médio e, no mês seguinte, para instituições municipais.
Segundo Kátia Schweickardt, secretária municipal de educação da capital amazonense, a discussão sobre a educação não pode se restringir ao “abre ou fecha das escolas”. Ela explicou que as escolas estão sendo um ponto de apoio e suporte físico para os alunos que não tem acesso à televisão, tablet, computador ou celular. “Professores que tenham dificuldade com a tecnologia ou conexão com a internet também podem ir às unidades preparar o material de ensino e dar suporte aos seus alunos”, detalhou Kátia.
Rossieli Soares, secretário de educação do Estado de São Paulo, explica que, das 5.000 escolas de São Paulo, já são cerca de 900 com atividades presenciais extracurriculares, como aulas de reforço. O mesmo acontece no Paraná, onde já foram reabertas 54 escolas em regiões com baixo índice de mortes por coronavírus.
Desigualdade de acesso como questão central
Ida Larruscain é diretora da Escola Estadual de Ensino Fundamental Vitéllio Gazapina em Sant’Ana do Livramento (RS). Localizada na fronteira do Brasil com o Uruguai, a escola recebe alunos do país vizinho e de outras regiões.
“Com o distanciamento, tivemos de nos adaptar e atender a diversidade de alunos que temos. A nossa maior dificuldade é com a tecnologia e conectividade. Nós recebemos, todos os dias, pedidos de pais e alunos para que a escola empreste notebooks. Infelizmente nós não temos e acabamos sendo excludentes nesse sentido”, lamenta a diretora.
Com 70 milhões de brasileiros com acesso precário à internet, a pandemia forçou diversas famílias a se digitalizarem, aumentando a disparidade entre alunos quem têm e os que não têm acesso à tecnologia.
Marcela Jara Villavicencio, diretora de escola pública e professora estadual de História e Geografia no Chile, afirma que seus alunos também enfrentam as mesmas dificuldades: “A lacuna da educação está agora dentro da sala de aula entre estudantes que têm acesso ou não à internet. Não é mais uma lacuna entre escolas privadas ou públicas”.
O ensino privado se adaptou melhor do que o público?
Kátia Schweickardt defende que a oferta do serviço entre ensino público e privado não difere em nada. “Na rede pública, nós temos trabalhado com agilidade, qualidade, com uma gestão arrojada e inovadora, mas a nossa dificuldade, no entanto, não está marcada só pela pandemia, ela está marcada pela situação social brasileira”, aponta a secretária municipal de educação de Manaus (AM).
Elza Fernandes, secretária municipal de educação de Campo Grande (MS), reforça a fala de Kátia sobre a qualidade do ensino público. “Quando iniciamos a pandemia, com as aulas presenciais suspensas, nós estávamos com 107 mil alunos. Hoje nós estamos com 109 mil alunos, pois muitos alunos das escolas particulares migraram para a rede pública, que estavam bem preparadas”.
Aula em Casa
O Estado do Amazonas adotou o projeto Aula em Casa durante a paralisação das atividades presenciais. A solução multiplataforma foi criada para transmitir aulas a distância para os alunos das redes estadual e municipal na TV aberta, em sites e aplicativos.
O projeto Aula Digital, que engloba as cinco dimensões do ProFuturo – programa global da Fundação Telefônica e Fundação La Caixa, apoiou a construção das aulas por meio de formação e assessoramento para o uso de tecnologia a professores de Língua Portuguesa e Matemática dos anos iniciais do Ensino Fundamental da rede municipal, totalizando 195 mil estudantes beneficiados.
A aproximação entre professores e alunos é essencial
Arthur Cabral é professor de ciências e biologia na Escola Estadual Deputado Oscar Carneiro, em Camaragibe (PE). Com as escolas temporariamente fechadas pela pandemia, alguns de seus alunos não vinham participando das aulas online. O professor resolveu então imprimir as atividades e ir, de bicicleta, à casa desses estudantes toda sexta-feira. “Chegando lá, eu pude confirmar que eles não estavam participando por falta de internet ou de algum aparelho, como telefone ou computador. Houve uma aproximação e o rendimento aumentou”, comemora Arthur.
Histórias como a do Arthur não foram incomuns durante o isolamento. Muitos professores, durante o Jeduca 2020, comentaram ter se aproximado dos alunos indo até suas casas ou estando disponíveis por mais tempo durante o dia para tirar dúvidas. “Agora nós trabalhamos em qualquer horário. Muitas vezes, o aluno só consegue pegar o celular para estudar quando o pai ou a mãe chegam em casa, às 10 ou 11 horas da noite”, conta.
Segundo o professor associado da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) José Alves da Silva, a pandemia escancarou o papel estratégico dos professores e gestores das escolas públicas. “São eles que conseguem chegar mais perto dos estudantes, que vislumbram questões de abuso, fome, adoecimento, e que fazem a interface com a Saúde, Conselho Tutelar e demais órgãos”, explica.
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Não se trata apenas da conectividade
O professor José Alves da Silva também aborda que as barreiras trazidas pela pandemia não se tratam apenas sobre ter computador ou conectividade.
“A gente não sabe como estão as questões de afetos, do trabalho, da relação com a morte, das relações pessoais e intrafamiliares. É um conjunto de incertezas em relação ao futuro, não menos importantes que a conectividade. E isso acomete não só os alunos mais pobres”, defende o especialista da Unifesp. “Às vezes é impossível, do ponto de vista emocional, estudar química ou física”.
O jornalista Raphael Preto concorda e traz para o debate o problema do monitoramento dos estudantes com deficiência em aulas regulares. “Pela falta de monitoramento não se sabe se estes alunos conseguem ou não fazer as atividades”, comenta. O podcast da Agência Mural de Jornalismo das Periferias, Em Quarentena, entrevistou mães de crianças com deficiência. Elas afirmaram ter percebido vários sinais de regressão dos filhos em relação à socialização, por exemplo.
Oportunidade para uma nova forma de ensino
Durante a mesa A pandemia e a volta às aulas em diferentes países, os convidados concordaram que ficou mais evidente com a pandemia o fato de a escola ser um espaço para aprender aquilo que a tecnologia não poderá substituir, como habilidades sociais, comunicativas, e de relacionamento.
Mario Fiore, que é venezuelano e professor de idiomas na Ilha de Tenerife, na Espanha, onde trabalha com imigrantes e refugiados da Cruz Vermelha, deixou um apelo: “não devemos esquecer que, em toda crise, as mulheres, os refugiados, as minorias étnicas são as que mais sofrem. E, se estamos em um espaço de privilégio e vantagens, temos a obrigação de ajudar”.
A professora chilena Marcela Jara afirmou que a pandemia tencionou todo o sistema educativo do país, que já estava desconectado dos processos de globalização. Para ela, seria uma chance para mudanças de paradigma. “É uma oportunidade para que em 2021 possamos transitar para um modelo de projetos, avaliações formativas e trabalhos colaborativos. O professor deve ser o mediador, e não aquele que entrega o conteúdo”.
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