O letramento digital como conjunto de habilidades que facilita o processo de inclusão no ambiente tecnológico é fundamental em um mundo conectado
O letramento digital está em alta. Isto porque a popularização das tecnologias está transformando a sociedade contemporânea e exigindo o desenvolvimento de novas habilidades. Assim, boa parte dos conhecimentos e das informações agora são encontrados na internet, e aparecem com uma linguagem própria, que não abrange apenas letras e palavras. Mas, sonbetudo, envolve também códigos, imagens, vídeos, entre outros elementos.
Uma pessoa que não domina essa nova comunicação pode ser excluída de uma série de espaços e, para impedir que isto aconteça, é necessário o letramento digital. Ou seja, o desenvolvimento da capacidade de usar as ferramentas, buscar conhecimentos e informações, compreender e interagir no meio digital com qualidade e criticidade.
Letramento digital
“Antes, falava-se em letramentos no sentido amplo, que abraçava, entre outras, as práticas ligadas a tecnologias de leitura e de escrita. O que fizemos foi especificar esses letramentos, chamando-os por esse nome adjetivado ao adicionar o digital”, explica Ana Elisa Ribeiro, professora titular do Departamento de Linguagem e Tecnologia do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG).
Segundo a professora, a tecnologia digital surgiu depois da Segunda Guerra Mundial, porém a noção de letramento é bem posterior a esse período. Letramento digital veio só mais tarde e, no Brasil, esse conceito ganhou destaque a partir da década de 90 para compreendermos como e por que as tecnologias digitais, que entraram nas nossas vidas de forma acelerada, impactam as práticas sociais.
“Assim como um indivíduo letrado que, além de ler e escrever de forma básica, consegue fazer uso da escrita e da leitura no seu dia a dia, o letrado digital deriva desse conceito aplicado ao mundo digital, que acompanha os avanços tecnológicos vividos pela sociedade”, aponta a especialista.
O letramento digital varia para cada indivíduo e pode ser desenvolvido e ampliado em qualquer fase da vida, conforme explica Maria Cristiane Barbosa Galvão, professora doutora da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP.
“Muitas pessoas possuem um letramento digital básico, como usar um aplicativo de mensagem no celular, fazer uma chamada de vídeo ou enviar um arquivo de áudio. Outras possuem essa habilidade mais avançada, empregando tecnologias da informação para fins profissionais que demandam conhecimento especializado.”
Ela ressalta que não se deve confundir o acesso a um equipamento tecnológico e à conectividade com letramento. “A pandemia demonstrou que muitas pessoas possuem celular, mas não sabem operar uma conta digital bancária ou não conseguem identificar quando uma informação é fake news“, afirma. “Há ainda muita confusão entre usar tecnologias digitais para lazer, e usá-las de forma produtiva para aprendizagem e para o contexto do trabalho”, complementa.
Letramento digital na Educação Básica
A mescla dos avanços tecnológicos com as metodologias educacionais tradicionais resultaram em uma educação nova, que está sendo chamada agora de Educação 4.0. Ou seja, fazendo menção à Revolução 4.0, ou Quarta Revolução Industrial, que se refere à incorporação do mundo físico ao digital.
Sendo assim, neste novo modelo educacional torna-se importante o letramento digital, pois os jovens são familiarizados com a internet, o celular e o computador e suas experiências pessoais e, futuramente, profissionais, dependem desta educação.
Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC)
De acordo com a professora Ana Elisa, um ponto fundamental para levar práticas e oportunidades de letramento digital para a escola é ter a instituição como um espaço permeado por tecnologias. “Essas ferramentas deveriam ser parte da infraestrutura, e não um diferencial entre uma escola ou outra. As Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) deveriam ser entendidas como as paredes, as carteiras e a lousa”, afirma.
Sem isso, segundo ela, é impossível fazer projetos de desenvolvimento, ampliação ou mesmo iniciação de práticas em letramento digital, e esta realidade é agravada quando os jovens não têm acesso às TDIC em outros locais para além da escola.
Apesar de existirem comunidades escolares que montaram laboratórios de informática bem equipados, e conduzem projetos voltadas às TDIC, muitas ainda proíbem o uso de celular e internet em sala de aula. “Como vimos durante a pandemia, TDIC e letramento digital não são conhecimentos generalizados.
Para ela, não se trata de ‘levar letramentos’ para a sala de aula e, sim, favorecer oportunidades de desenvolvimento digital, o que acontece apenas se as tecnologias, as pessoas e a prática estiverem convergindo.
Segundo a especialista, a formação de professores é fundamental para o desenvolvimento de atividades e projetos de letramento digital nas escolas. Caso não ocorra, as práticas tradicionais de ensino podem ser transferidas para aquelas mediadas por recursos tecnológicos de forma não planejada e, por consequência, desconsideram o potencial acadêmico das novas tecnologias e não geram o resultado esperado.
Como exemplo do que poderia ser feito com os estudantes estão a apresentação de bibliotecas virtuais, como usar adequadamente as plataformas educacionais e de lazer, a localização dos recursos informacionais confiáveis, além de como analisar a qualidade de uma informação.
O que diz a BNCC
A Base Nacional Comum Curricular estabelece que os estudantes devem dominar o universo digital, a partir de competências e habilidades relacionadas ao uso crítico e responsável das tecnologias digitais, que fazem parte da quinta competência geral da BNCC, chamada Cultura Digital.
Para apoiar a construção de currículos escolares e de propostas pedagógicas que contemplem o uso de Tecnologias Digitais de Informação nas escolas para o letramento digital, o Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb) elaborou e disponibilizou de forma aberta e gratuita o Currículo de Referência em Tecnologia e Computação (2018).
Inclusão digital na vida adulta
O Brasil ocupa a 5ª posição mundial no uso diário de internet, com 78,3% da população on-line. Neste cenário, não estar incluído nestas práticas sociais é uma forma de exclusão. “Não ter esse tipo de conhecimento significa não exercer plenamente seus direitos”, afirma. Assim, a inclusão social passa por ter conhecimento e alguma desenvoltura para ler, escrever e usar essas ferramentas digitais.
“Mesmo os docentes universitários, pessoas geralmente com excelente nível educacional, carecem de algum letramento digital”, comenta a professora doutora da USP, Cristiane Galvão. “Nem sempre uma pessoa adulta com baixo letramento digital tem a consciência de que pode se aperfeiçoar neste campo.”
A docente sugere que instituições de ensino, empresas públicas e privadas estejam atentas a este aspecto é que, na medida do possível, tenha equipes para realização de diagnósticos e fornecimento de soluções adequadas para cada perfil e situação.