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A pobreza menstrual vai além da falta de recursos para a compra de absorventes higiênicos, impactando até no desempenho escolar. Conheça iniciativas que trabalham para conter esse problema

#Educação#Educadores#ProFuturo

Imagem mostra grupo de meninas do coletivo Girl Up Elza Soares fazendo a doação de absorventes para mulheres de uma comunidade do Rio de Janeiro. É possível ver oito mulheres na imagem.

Miolo de pão, meias, folha de jornal, sacola plástica, filtro de café, roupa velha, algodão e papel higiênico. Esses são alguns exemplos de produtos não indicados que muitas mulheres utilizam para absorver a menstruação, todos os meses. Com isso, colocam a própria saúde em risco. Todas elas sofrem com a pobreza menstrual. A informação é do estudo realizado este ano pela Sempre Livre, em parceria com os Institutos Kyra e Mosaiclab.

Pobreza menstrual é um problema que afeta mulheres, meninas, homens transexuais e pessoas não binárias que menstruam, mas que não têm acesso a meios seguros para garantir a própria higiene. A questão vai além da falta de recursos para a compra de absorventes. Pode envolver desde a ausência de apoio até a carência de infraestrutura e de saneamento básico no lugar onde a pessoa vive.

“É a falta de acesso a itens básicos de higiene durante a menstruação, mas também a falta de informação, de dinheiro para comprar absorvente, a falta de confiança que mulheres têm nesse período da vida e a falta de apoio”, declara a antropóloga Mirian Goldenberg em entrevista à revista Marie Claire.

Pobreza menstrual e a falta às aulas 

A menstruação é uma necessidade biológica. O marco do início da vida reprodutiva. Pessoas com útero menstruam todos os meses. Segundo dados do relatório Livre para Menstruar, anualmente cerca de 1,4 milhão de brasileiras completam 13 anos. É nessa idade que costuma acontecer a menarca – a primeira menstruação.

Em plena idade escolar, essas meninas aprendem a conviver com as transformações do corpo e com uma nova rotina e desafios para manterem a sua higiene menstrual, inclusive na escola.

Entretanto, 713 mil meninas não têm acesso a banheiro ou chuveiro em casa. E mais de 4 milhões de estudantes frequentam escolas sem infraestrutura de higiene, como banheiros sem pias, lavatórios e papel higiênico. É o que aponta a pesquisa Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos, realizada pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

Essas condições são determinantes para que as estudantes faltem às aulas pelo fato de estarem menstruadas. Nesse sentido, o desempenho escolar é colocado em risco e, consequentemente, elas vêem reduzidas as chances de desenvolvimento de seu potencial.

O estudo mostra que 62% das meninas já deixaram de ir à escola no período da menstruação. Em muitos casos, pela falta de condições de comprar absorventes. E 73% se sentiram constrangidas na escola por estarem menstruadas, segundo a pesquisa do Unicef.

“Elas não dizem que faltaram à aula porque não têm dinheiro para comprar absorvente. Ficam em casa isoladas, sem apoio, sofrendo, inseguras, sem confiança, não falam com as amigas e sofrem sozinhas”, aponta Miriam.

Garotas com voz ativa em todo o país 

Foi por causa da força da voz de um grupo de meninas de 17 a 20 anos que absorventes descartáveis passaram a ser obrigatórios na cesta básica do estado do Rio de Janeiro. No início da pandemia, o Girl Up Elza Soares realizou uma campanha que arrecadou, em um mês, 1500 pacotes de absorventes. Todos foram entregues com as cestas básicas doadas por uma ONG em uma comunidade da capital.

“Mas as pessoas menstruam todos os meses e nós percebemos que não conseguiríamos fazer a campanha todos os meses. Precisávamos de algo concreto e buscamos ajuda do poder público. Encontramos um deputado estadual que aceitou ouvir nossa proposta. Juntos, redigimos um projeto de lei estadual sobre inclusão de absorventes em cestas básicas, que foi aceito por unanimidade e protocolado”, explica Amanda Menezes, líder do Girl Up Elza Soares.

Fundado há mais de dois anos, o Girl Up Elza Soares faz parte de um movimento internacional da Fundação ONU que visa incentivar a liderança feminina. É formado por cerca de 40 pessoas e realiza projetos com foco em meninas em situação de vulnerabilidade na zona norte do Rio de Janeiro. Também faz ações em aldeias indígenas, para mulheres no esporte e para pessoas LGBTQIA + em escolas.

A partir do exemplo das jovens cariocas com os projetos de lei sobre pobreza menstrual, meninas dos clubes de outros estados perceberam que também poderiam fazer algo parecido.

“Assim surgiu o Movimento Livre para Menstruar, idealizado e fundado pelo Girl Up Brasil. Ele reúne todas as meninas que querem trabalhar com advocacy política e pobreza menstrual. Por conta disso, vários estados já estão com projeto de lei de pobreza menstrual protocolados”, conclui Amanda.

 

Conscientização para a redução da pobreza menstrual 

Há diversas ações bem sucedidas no terceiro setor e em áreas como educação e saúde com foco em pobreza menstrual no país. Mas, apesar dos esforços, o tema ainda é desconhecido e, muitas vezes, considerado um tabu.

“Nosso principal desafio é expor para setores mais privilegiados da sociedade as situações desumanas a que são submetidas as pessoas que menstruam e não têm acesso a saneamento e absorventes. Tudo começa pela conscientização, sem a qual não há como gerar mobilização e ações efetivas para mitigar o problema”, afirma Victoria Dezembro, fundadora do Projeto Luna.

A iniciativa surgiu em agosto de 2020 após a reflexão e a preocupação de Victoria ao ler um artigo que descrevia a situação desumana de pobreza menstrual enfrentada por presidiárias brasileiras.

A atuação do coletivo é focada na doação de kits de higiene e na divulgação de informações sobre o tema para educar, conscientizar e mobilizar a sociedade. Em pouco mais de um ano, foram entregues 577 kits – cerca de 17.310 absorventes – a pessoas que menstruam e que vivem em situação de vulnerabilidade nas ruas da capital paulista.

Certa de que o projeto faz a diferença para que a questão da pobreza menstrual evolua no país, Victoria celebra uma conquista recente do coletivo.

“Fechamos um acordo com a Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da USP, para estruturarmos uma ação recorrente de distribuição de kits de higiene menstrual na penitenciária feminina da capital paulista”, conta.

O próximo grande passo da iniciativa será o lançamento de uma linha de moda íntima feminina com a marca do projeto. Parte dos lucros obtidos com as vendas será revertido para os trabalhos do coletivo.

Você sabe o que é pobreza menstrual?
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